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sábado, 31 de março de 2018

A ÚLTIMA CEIA

O Significado Espiritual da Páscoa

O Significado Espiritual da Páscoa

A celebração da Páscoa carrega consigo um profundo significado tanto para a tradição cristã católica quanto para a tradição judaica. Para compreendermos melhor este momento histórico, é fundamental explorarmos como estas duas tradições se entrelaçam em um período crucial da história religiosa.

A Celebração Católica

Na tradição católica, a Semana Santa representa um período de intensa devoção e reflexão espiritual. Durante este tempo sagrado, os fiéis revivem os momentos fundamentais da fé cristã: a Paixão, a Morte e, no ápice das celebrações, a Ressurreição de Jesus Cristo. O Domingo de Páscoa emerge como o ponto culminante destas celebrações, trazendo consigo uma mensagem poderosa de esperança e renovação, simbolizada pela vitória da vida sobre a morte.

O Significado da Páscoa Judaica

Para compreendermos o contexto histórico completo, é essencial reconhecermos que a Páscoa judaica, ou Pessach, representa um marco fundamental na história do povo hebreu. Esta celebração comemora um momento decisivo: a libertação do povo judeu após quatrocentos anos de escravidão no Egito. É particularmente significativo observar que os eventos finais da vida terrena de Jesus coincidiram precisamente com este período festivo judaico.

Jerusalém: Centro das Celebrações

Jerusalém, naquele período, ocupava uma posição central na vida religiosa judaica. O majestoso Templo de Salomão, localizado no coração da cidade, servia como epicentro das principais cerimônias religiosas. Durante o período pascal, que se estendia por oito dias, a cidade santa transformava-se em um verdadeiro centro de peregrinação, recebendo fiéis de todas as partes da Palestina.

Jesus em Betânia

Em meio a este cenário de intensa movimentação religiosa em Jerusalém, encontramos Jesus em um momento particularmente tocante de sua jornada. Embora as celebrações pascais estivessem em curso na cidade santa, ele havia se dirigido a Betânia, atendendo ao chamado urgente de duas amigas próximas, Marta e Maria, cujo irmão Lázaro encontrava-se gravemente enfermo.

Como registrado no Evangelho de João, capítulos 11, versículos 1-3 e 39, quando Jesus finalmente chegou a Betânia, deparou-se com uma situação ainda mais grave do que a inicialmente reportada: Lázaro já havia falecido e seu corpo jazia no sepulcro há quatro dias, em estado de decomposição.

O Milagre de Lázaro

Em um dos episódios mais extraordinários registrados nas escrituras, Jesus realiza o que viria a ser considerado seu milagre mais notável. Diante de numerosas testemunhas, com uma autoridade que emanava de sua própria natureza divina, Jesus ordenou com voz potente:

"Lázaro, sai para fora!"(João 11:43)

O impacto deste acontecimento foi imenso, provocando profunda comoção entre os presentes. A ressurreição de Lázaro representou um marco sem precedentes na história, e a notícia deste fenômeno extraordinário disseminou-se rapidamente por toda a Palestina, atraindo multidões que se dirigiam a Betânia para testemunhar pessoalmente o milagre.

A Entrada Triunfal em Jerusalém

O retorno de Jesus a Jerusalém durante as festividades pascais transformou-se em um momento de singular grandiosidade. A cidade, já repleta de peregrinos para as celebrações da Páscoa, foi tomada por uma atmosfera de júbilo extraordinário quando se espalhou a notícia de sua aproximação (João 12:12). O povo, movido por intensa emoção e reconhecimento, criou um cenário de celebração única: ramos de palmeiras foram dispostos ao chão, formando um tapete verde natural, enquanto hinos e salmos ecoavam pelas ruas da cidade santa.

O Simbolismo da Entrada Real

A forma como Jesus escolheu entrar em Jerusalém carregava um profundo significado simbólico. Diferentemente dos reis da época, que costumavam fazer suas entradas triunfais montados em cavalos imponentes após vitórias militares, Jesus optou por um jumento como sua montaria. Esta escolha não foi casual - representava a natureza singular de sua realeza. Como Príncipe da Paz, sua entrada humilde simbolizava que seu reino transcendia as conquistas terrenas, fundamentando-se nos princípios eternos do amor e da paz.

A Conspiração e os Preparativos para a Última Ceia

Em meio à exaltação popular, uma trama sombria se desenvolvia nos bastidores. Os fariseus, que já haviam decidido pela morte de Jesus (João 11:53-57), aguardavam um momento oportuno para efetuar sua captura, longe dos olhos do povo que o adorava. Jesus, plenamente consciente de sua situação e sabendo que seu tempo estava próximo (João 11:1), nutria um desejo especial de compartilhar uma última ceia pascal com seus discípulos (Lucas 22:11).

O Homem do Cântaro

Em um episódio marcado por elementos misteriosos, Jesus enviou Pedro e João com instruções precisas: deveriam encontrar, às portas da cidade, um homem carregando um cântaro. Esta figura enigmática, cujo nome permanece desconhecido nos registros evangélicos, seria o providencial anfitrião da última ceia. Conforme narrado em Lucas 22:8-13, este homem, em um gesto de generosa hospitalidade, disponibilizou sua casa para que Jesus e seus discípulos realizassem a sagrada celebração pascal.

A Promessa do Consolador

Durante a última ceia, Jesus compartilhou com seus discípulos uma promessa significativa que geraria diferentes interpretações ao longo da história. Nas palavras registradas no Evangelho de João, capítulos 14:15-26, Jesus anunciou a vinda de outro Consolador, uma presença que permaneceria com seus seguidores eternamente. Este momento crucial das escrituras merece uma análise cuidadosa em seu contexto histórico e espiritual.

O Consolador

Na perspectiva da doutrina espírita, este anúncio feito por Jesus representa um marco fundamental. O espiritismo, codificado por Allan Kardec no século XIX, é interpretado como a materialização desta promessa feita na última ceia. Segundo esta compreensão, assim como Moisés recebeu os Dez Mandamentos diretamente dos céus, Kardec teria sido escolhido como instrumento para sistematizar e codificar os ensinamentos transmitidos por entidades espirituais através de diversos médiuns.

O Espiritismo como Chave Interpretativa

A doutrina espírita propõe uma nova perspectiva para a compreensão dos ensinamentos cristãos. De acordo com esta visão, muitas das passagens que parecem enigmáticas nos textos sagrados encontram explicação mais clara através dos princípios espíritas. Esta interpretação sugere que, na época de Jesus, a humanidade ainda não possuía o desenvolvimento intelectual e científico necessário para compreender plenamente todos os ensinamentos transmitidos.

A Codificação Espírita

O desenvolvimento da doutrina espírita materializou-se através de cinco obras fundamentais: "O Livro dos Espíritos", "A Gênese", "O Livro dos Médiuns", "O Céu e o Inferno" e "O Evangelho Segundo o Espiritismo". Segundo os adeptos desta doutrina, estas obras representam uma revelação progressiva, possível apenas quando a humanidade alcançou um nível adequado de desenvolvimento filosófico e científico para compreender os ensinamentos mais profundos do Cristo.

O Legado do Amor na Última Ceia

Durante a última ceia, Jesus transmitiu aos seus discípulos um dos ensinamentos mais profundos e transformadores: a supremacia do amor como virtude fundamental para a evolução espiritual. Este momento singular estabeleceu um novo paradigma na compreensão do amor divino, transcendendo a antiga máxima de "amar ao próximo como a si mesmo" para um patamar ainda mais elevado.

A Dimensão do Amor Cristão

Jesus estabeleceu um novo parâmetro quando declarou: "Amai-vos uns aos outros. Não apenas como amais a vós mesmos, mas amai-vos ainda mais, como eu vos amei" (João 13:34). Esta afirmação revolucionária define a verdadeira identidade de seus discípulos: seriam reconhecidos não por sinais externos ou rituais, mas pela extraordinária capacidade de amar incondicionalmente.

A Epístola do Amor

O apóstolo Paulo, em sua primeira carta aos Coríntios, elaborou uma das mais belas e profundas reflexões sobre o amor já registradas. Sua mensagem, que atravessou séculos inspirando gerações, revela que mesmo os dons mais extraordinários - seja o dom das línguas, da profecia ou uma fé capaz de mover montanhas - tornam-se vazios sem a presença do amor. Esta passagem bíblica transcendeu sua origem religiosa para se tornar uma reflexão universal sobre a natureza do amor verdadeiro.

O Amor Universal na Perspectiva Espiritual

A narrativa apresentada no livro "Paulo e Estevão", psicografado por Chico Xavier e atribuído ao espírito Emmanuel, oferece uma perspectiva profunda sobre a universalidade do amor divino. Na cena final, quando Jesus, acompanhado de Estevão, encontra o espírito de Paulo após seu desencarne, revela-se uma verdade fundamental: no reino de Deus, verdugos e mártires são chamados à união eterna, ilustrando a natureza incondicional do amor divino.

O Serviço como Expressão do Amor

Na mesma última ceia, quando os discípulos discutiam sobre quem seria o maior no Reino de Deus (Lucas 22:24-27), Jesus apresentou um princípio revolucionário: a verdadeira grandeza espiritual se manifesta através do serviço ao próximo. O ato de servir torna-se, assim, a expressão prática do amor, formando com ele um binômio inseparável na jornada evolutiva do espírito.

A União dos Verbos Transformadores

Os verbos "amar" e "servir" emergem, assim, como as duas faces de uma mesma moeda espiritual. Não existe amor verdadeiro sem serviço, nem serviço autêntico sem amor. Esta conjugação representa o caminho para a elevação espiritual, conduzindo o ser humano em sua jornada rumo à angelitude.

A Dinâmica Psicológica da Última Ceia

A última ceia revelou-se como um momento de profunda significância psicológica, especialmente através dos episódios envolvendo Pedro e Judas. Estes eventos transcendem o mero registro histórico, representando arquétipos universais que habitam a psique humana. O modo como Jesus conduziu este momento demonstra uma sofisticada abordagem terapêutica, buscando trazer à consciência aspectos sombrios que necessitavam de reconhecimento e transformação.

O Processo de Despertar de Judas

A interação entre Jesus e Judas durante a última ceia revela uma dimensão particularmente profunda da pedagogia divina. Jesus, percebendo as perturbações psíquicas de seu discípulo, atuou como um mestre compassivo, empenhando-se em proporcionar uma última oportunidade de despertar espiritual. O momento culminante desta intervenção ocorreu quando Jesus, através do gesto simbólico do pão (João 13:26), tornou manifesta a iminente traição.

A Questão do Livre-Arbítrio

A frase pronunciada por Jesus a Judas - "Faça logo o que você tem que fazer" (João 13:27) - tem sido objeto de diversas interpretações ao longo da história. Contudo, é fundamental compreender que esta não representava uma determinação do destino, mas sim um chamado à consciência. Ninguém vem ao mundo com a missão de praticar atos negativos; a verdadeira missão de cada ser humano consiste na superação de suas próprias limitações e na transformação de padrões comportamentais inadequados herdados de experiências anteriores.

As Motivações de Judas

A complexidade do comportamento de Judas revela-se em sua profunda conexão com as ilusões materiais. Sua visão estava limitada por expectativas terrenas, acreditando que a entrega de Jesus ao Sinédrio desencadearia uma revolução política que resultaria na libertação do povo judeu. Esta interpretação equivocada foi possivelmente reforçada pela recente aclamação popular de Jesus em Jerusalém (João 12:13), onde a multidão o reconheceu como rei dos judeus.

O Propósito Divino da Experiência

A trajetória de Judas junto a Jesus durante todo seu ministério representa uma oportunidade extraordinária de evolução espiritual. Tendo recebido diretamente da fonte mais pura os ensinamentos espirituais, Judas encontrava-se diante do momento decisivo de sua jornada evolutiva. Sua experiência serve como um poderoso lembrete de que cada ser humano tem a responsabilidade de transformar sua perspectiva em relação ao mundo e a si mesmo.

O Reflexo Universal da Experiência de Judas

A narrativa de Judas representa um paradigma que transcende seu contexto histórico específico, servindo como um espelho para nossa própria jornada espiritual. Quando examinamos sua trajetória, percebemos que, assim como ele teve acesso direto aos ensinamentos de Jesus, muitos de nós também recebemos continuamente conhecimentos e experiências espirituais enriquecedoras. Esta analogia nos leva a uma reflexão profunda: de que maneira estamos aproveitando esse alimento espiritual para nossa transformação pessoal?

O Despertar da Consciência

A sabedoria antiga nos ensina que existem dois momentos cruciais em nossa existência: o dia em que nascemos e o dia em que descobrimos o porquê de nosso nascimento. Esta descoberta está intrinsecamente conectada ao processo de evolução espiritual, que só pode ser alcançado através de um profundo trabalho de autoconhecimento. Nesta jornada, Jesus permanece como o paradigma supremo, iluminando nosso caminho em direção ao aperfeiçoamento moral com seus ensinamentos atemporais.

A Urgência da Transformação

O momento presente nos convoca a uma transformação urgente e profunda. As ilusões materiais, por mais sedutoras que sejam, carregam em si a marca da transitoriedade. Quando investimos excessivamente em conquistas materiais, corremos o risco de nos desviar de nosso propósito essencial na Terra. O tempo, em sua inexorável marcha, nos lembra constantemente da importância de priorizar nosso crescimento espiritual.

A Inércia como Forma de Traição

Quando permanecemos inertes diante do chamado à evolução espiritual, praticamos uma forma sutil, porém significativa, de traição aos propósitos superiores de nossa existência. Esta inércia representa não apenas uma traição ao nosso projeto encarnatório, mas também aos ensinamentos fundamentais de Jesus, que constantemente nos convidam à renovação interior. A responsabilidade de agir e transformar-nos é individual e intransferível.

A Consciência do Tempo e sua Importância

A observação profunda de Chico Xavier sobre o maior tormento dos espíritos após a morte - a consciência do tempo perdido - ressoa como um alerta fundamental para todos nós. Esta perspectiva nos convida a uma reflexão séria sobre como estamos utilizando o precioso tempo de nossa existência terrena, lembrando-nos que cada momento presente é uma oportunidade única e irrecuperável para nossa evolução espiritual.

Conclusão: O Chamado à Transformação Interior

A jornada através dos eventos da última ceia e seus desdobramentos nos oferece muito mais que um simples registro histórico - representa um convite permanente à reflexão e à transformação. As lições extraídas destes acontecimentos transcendem o tempo e o espaço, permanecendo vivas e relevantes para cada geração que se dispõe a estudá-las e compreendê-las.

O exemplo de Jesus, sua sabedoria ao lidar com as fragilidades humanas e sua capacidade de transformar momentos de crise em oportunidades de crescimento, nos ensina que a verdadeira evolução espiritual requer coragem, determinação e, sobretudo, amor. Seja através da promessa do Consolador, da ênfase no amor e no serviço, ou das lições extraídas dos momentos de traição e negação, cada aspecto desta narrativa nos convida a um despertar mais profundo de nossa consciência espiritual.

Em última análise, somos todos chamados a realizar nossa própria transformação interior, aproveitando cada momento presente como uma oportunidade preciosa de crescimento. O tempo não espera, e a urgência desta transformação se faz cada vez mais presente em nossa jornada evolutiva. Que possamos, inspirados pelos ensinamentos eternos do Cristo, encontrar a coragem e a determinação necessárias para realizar essa transformação enquanto o tempo nos favorece.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

A FIGUEIRA QUE SECOU

A Narrativa do Evangelho

O Evangelho de Marcos, no capítulo 11, versículos 12 a 20, narra que Jesus caminhava rumo a Jerusalém na companhia de seus discípulos. Em dado momento da caminhada, diante de uma figueira com folhas verdes e sentindo fome, aproximou-se para colher algum fruto. Ao verificar a ausência de frutos — até porque não era tempo de figos —, disse à figueira que nunca mais produziria frutos.

Ao retornar de Jerusalém rumo à Galileia, percorreu o mesmo trajeto da ida, e os discípulos notaram que a figueira realmente secara desde a raiz. Então Pedro comentou: 'Mestre, eis que a figueira que amaldiçoaste secou.'

A leitura dessa passagem causa perplexidade a qualquer leitor, que fica a se perguntar como é possível que Jesus, o Mestre do Amor, amaldiçoe uma árvore só porque ela não lhe ofereceu um fruto fora da estação.

O Simbolismo da Figueira

Embora certos comportamentos de Jesus possam parecer estranhos à primeira vista, é importante entender que o Mestre não transmitia seus ensinamentos apenas por meio das palavras, mas sobretudo através de suas ações. E toda ação de Jesus carrega um conteúdo superior que exige do intérprete um mergulho espiritual na lição do Cristo.

A representação da figueira que não deu frutos temporãos para saciar a fome de Jesus é apenas o contexto que o Mestre utilizou para canalizar a lição transmitida. Aquela figueira não podia ter frutos; tanto é que o evangelista Marcos fez questão de ressaltar que não era época de figos. No entanto, aquela figueira estava exuberante em folhas, porque era uma árvore que se adiantou e encheu-se de folhas, criando assim a expectativa de figos.

O Significado no Antigo Testamento

A imagem é simbólica e, em se tratando de símbolos, é imprescindível buscar no Antigo Testamento o significado simbólico das representações que compõem o quadro desta passagem narrada em Marcos.

No livro do profeta Oséias, que viveu em 700 a.C., no capítulo 9, versículo 10, está narrado: 'Achei Israel como uvas no deserto, vi vossos pais como a fruta temporã da figueira no seu princípio.'

O profeta Oséias compara o povo hebreu a um figo temporão na figueira. Temporão porque aquele era um povo que estava à frente dos outros povos da época. Os hebreus estavam numa situação espiritual mais avançada em relação aos seus contemporâneos: os egípcios, os babilônios, os sírios e todo o povo do Oriente Médio.

A Missão do Povo Hebreu

Os hebreus já tinham avançado espiritualmente a ponto de assimilar as leis morais que Moisés trouxe, sobre a existência de um Deus único, criador de todas as coisas. Os hebreus eram um povo à frente dos outros; por isso, os profetas os comparavam a uma árvore temporã.

Mas adiante, prossegue Oséias, dizendo: "Achei Israel como uvas no deserto, vi vossos pais como a fruta temporã da figueira no seu princípio, mas eles foram para Baal-Peor, e se consagraram a essa vergonha, e se tornaram abomináveis como aquilo que amaram."

A Transição Espiritual

Baal-Peor está relacionado ao culto de uma divindade de pedra que incluía orgias sexuais de irrestrita devassidão. Por isso, o profeta Oséias, que viveu 700 anos depois de Moisés, lamenta que o povo hebreu, destinatário da primeira revelação, em vez de se conduzirem movidos por essa nova regra de conduta, demonstravam ter falhado no projeto.

O profeta Miquéias, capítulo 7, versículo 1, diz o seguinte: "Ai de mim! Porque estou como quando são colhidas as frutas do verão, como os rabiscos da vindima: não há cacho de uvas para comer, nem figos temporãos que a minha alma desejou."

Rabiscos da vindima são os restos de uma colheita de uva. Era comum os camponeses deixarem, durante a colheita, parte dos frutos nas videiras e nas oliveiras para que os pobres se saciassem.Essa manifestação de Miquéias se apresenta como um verdadeiro desapontamento com a situação de Israel; por isso, compara o seu desalento ao desalento de alguém que vai apanhar os rabiscos das vindimas e nada encontra.

Todavia, Miquéias, ao dizer que não encontrava 'nem figos temporãos que a minha alma desejou,' revela que a natureza de sua fome é espiritual, posto que procedia da alma. E é exatamente essa a fome que Jesus desejava saciar: a fome da alma.

O Mestre enviou, por mil e quinhentos anos, vários profetas para preparar o solo dos corações para a semeadura que ele faria. E quando Ele vem, trazendo a mensagem luminosa do Amor, é natural que, antes de partir (pois essa passagem da figueira acontece uma semana antes de sua crucificação), Ele demonstre ter fome — mas uma fome de colher resultados à altura do investimento espiritual

No entanto, a árvore só apresentava folhas; não tinha frutos. Então, Ele diz: Nunca mais ninguém coma fruta dessa figueira,ou seja, a missão de iluminar os corações seria retirada do povo hebreu e transferida a outro povo.

O Brasil como Nova Terra do Evangelho

Dois mil anos depois, Humberto de Campos, pela psicografia de Chico Xavier, entrega a obra 'Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho.' No primeiro capítulo, há um diálogo entre Jesus e Helil, no qual o Mestre assevera em um determinado trecho:

'Para esta Terra maravilhosa e bem-dita, será transplantada a árvore do meu Evangelho de piedade e de amor. No seu solo dadivoso e fértil, todos os povos da Terra aprenderão a lei da fraternidade universal'.

A Missão Espiritual do Brasil

O verbo empregado por Jesus chama a atenção: 'transplantar'. Apontando o território brasileiro, Ele diz que nessa terra a árvore do Seu evangelho será transplantada, ou seja, vem para cá porque foi retirada de outro lugar.

O símbolo da árvore atravessou o tempo. Allan Kardec, quando terminou de compilar as informações do mundo espiritual, reunindo-as no 'Livro dos Espíritos', recebeu da equipe do Consolador instruções a respeito da ilustração que deveria estampar a capa do livro. Curiosamente, era mês de abril, não era tempo de figo, nem de uva, mas os espíritos disseram a ele: 'Desenha o ramo de uma videira, desenha um cacho de uva, porque esse é o emblema do trabalho do Criador. O espírito é uma videira. Deus é o agricultor, e Ele espera colher uva de nós.' (Prolegômenos).

O Brasil recebeu a árvore do Evangelho de Jesus que fora transplantada. A nossa missão é iluminar os corações, começando a tarefa pela nossa própria edificação íntima, porque ninguém conseguirá êxito na tarefa de modificar o mundo sem iniciar primeiro a própria transformação moral.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

A MULHER EQUIVOCADA

O Contexto Histórico do Adultério em Israel

O Evangelho narra que, naqueles dias de festa, havia grande tumulto nas ruas. Em dado momento, em meio a um grande alvoroço, um grupo de fariseus lançou aos pés de Jesus uma jovem mulher, flagrada em adultério.

Para o povo de Israel, a definição de adultério diferia entre homens e mulheres. Um homem só era acusado de adultério se mantivesse relações com uma mulher casada ou comprometida, pois entendia-se que, ao fazê-lo, ele agredia outro homem. Por outro lado, quando uma mulher cometia adultério, considerava-se que ela agredia o matrimônio.

A suspeita de adultério deveria ser submetida à prova da "água amarga". A mulher suspeita deveria ingerir uma bebida desagradável feita com pó coletado no Templo. Se ela vomitasse ou adoecesse após a ingestão, era considerada culpada.

O Encontro com Jesus

Aquela mulher que os fariseus levaram até Jesus havia sido surpreendida em flagrante adultério. A pena para tal ato era a morte. Os fariseus a submeteram ao julgamento de Jesus. Na verdade, embora tivessem olhos atentos para todas as faltas alheias, o objetivo naquele momento era mais aproveitar o incidente para armar uma cilada ao Profeta de Nazaré do que zelar pela pureza do matrimônio.

Eles a jogaram no chão, e ela ali ficou, sem coragem sequer de erguer os olhos. Sabia que havia delinquido e conhecia a penalidade. Sabia, igualmente, que ninguém teria piedade dela. Ninguém, exceto Ele.

A Escrita na Areia

Enquanto a indagação dos fariseus aguardava uma resposta do Rabi sobre a pecadora, Ele se inclinou e traçou na areia do pavimento caracteres misteriosos.

O que Ele estaria escrevendo? O nome do cúmplice que havia fugido? O nome do marido que, ferido no orgulho, permitia que sua esposa fosse tão vilmente tratada?

Diversos intérpretes do texto evangélico narram que Ele estaria grafando a marca moral do erro de cada um dos presentes. Curiosos, aqueles que ali esperavam a sentença de morte, para se extasiarem no espetáculo de sangue e impiedade, podiam ler: "ladrão", "adúltero", "caluniador", etc. Em síntese, suas próprias mazelas morais.

O Julgamento e o Perdão

A expectativa crescia. Jesus se ergueu e percorreu com o olhar perscrutador a turba dos acusadores, que sentiram ser atingidos em sua intimidade, e disse tranquilamente: "Aquele dentre vós que estiver sem pecado, atire-lhe a primeira pedra."

Em silêncio, os circunstantes começaram a se afastar, um a um, começando pelos mais velhos, pois os mais velhos carregam consigo uma maior soma de enganos e problemas, remorsos e amarguras.

No meio da indecisão geral, Jesus voltou a traçar na areia sinais enigmáticos. Quando o silêncio se instalou, Ele se levantou. Ali estava a mulher, à espera de seu castigo. Se todos os demais haviam partido, ela deveria esperar d'Ele a sentença e a execução.

O Divino Pastor considerou a fragilidade do ser humano e, compadecido com suas misérias morais, disse-lhe: "Mulher, onde estão aqueles que te acusavam? Ninguém te condenou?"

"Ninguém, Senhor", ousou responder, com a voz embargada.

Então, em vez do sibilar mortífero das pedras, ela ouviu as palavras de perdão e de vida: "Nem eu tampouco te condeno: vai e não peques mais!"

O Encontro Noturno

O espírito Amélia Rodrigues, no livro "Pelos Caminhos de Jesus", relata que, naquela noite, a mulher que errara procurou o Mestre na residência que o acolhia. Ela falou da fraqueza que a dominara nos dias de sua mocidade, sentindo-se sozinha.

O esposo, poucos dias após o matrimônio, retomara as noitadas alegres e despreocupadas com os amigos. Ela, sentindo-se carente, cedera ao cerco do sedutor, que a brindava com atenção e pequenos mimos. Nada disso a desculpava, ela reconhecia. E agora, consumada a tragédia, para onde iria? O esposo não a aceitaria de volta, especialmente após o espetáculo público. Também não poderia contar com a proteção paterna, pois fora levada à execração pública, não tendo recebido simplesmente uma carta de repúdio, o que poderia ter servido até como indenização ao seu pai, já que o marido que assim procedesse deveria devolver uma parte do dote da noiva ao sogro. Não havia lugar para ela em Jerusalém. O que seria dela, sozinha e desprotegida?

A Redenção e o Reencontro

O Mestre lhe acenou com horizontes de renovação, discorrendo sobre como a memória do povo é duradoura em relação às faltas alheias. Ela sentiu, nas entrelinhas, que deveria buscar outros lugares, paragens onde não a conhecessem, nem ao drama que acabara de viver.

Na despedida, Jesus a confortou: "Há sempre um lugar no rebanho do amor para as ovelhas que retornam e desejam avançar. Onde quer que vás, eu estarei contigo, e a luz da verdade, no archote do bem, brilhará à frente, clareando o teu caminho."

Dez anos se passaram, e ei-la em Tiro, em uma casa humilde, onde acolhe peregrinos cansados e enfermos desamparados. Ela erguera ali um refúgio de amor. Jamais esquecera daquele entardecer e da entrevista noturna.

Tornara-se uma divulgadora da Boa Nova. De seus lábios brotavam espontaneamente referências ao Doce Rabi, alentando as almas, enquanto cuidava das chagas dos corpos doentes.

Foi em um final de tarde que lhe trouxeram um homem à beira da morte. Ela o lavou e tratou-lhe as chagas. Deu-lhe caldo reconfortante e, tão logo percebeu que ele estava aliviado das dores, ofereceu-lhe uma mensagem de encorajamento, em nome de Jesus.

Emocionado, ele confessou que conhecera o Galileu em um infausto dia em Jerusalém. Odiara-O, então, porque Ele salvara a mulher que cometera adultério, sua esposa, mas não tivera para com ele, o ofendido, nenhuma palavra.

O tempo fez com que ele refletisse sobre como se equivocara em seu julgamento. Confessou que, há algum tempo, vinha buscando a companheira, procurando-a em muitos lugares, sem êxito. Até que a doença visitou seu corpo, consumindo-lhe as energias.

Embargada pelas emoções desenfreadas naquele momento, a mulher se recordou da praça e do diálogo à noite com o Mestre, um decênio antes, reconheceu o companheiro do passado e, sem dizer-lhe nada, segurou-lhe a mão suavemente e o consolou: "...Deus é amor, e Jesus, por isso mesmo, nunca está longe daqueles que O querem e buscam. Agora durma em paz enquanto eu velo, porquanto, nós ambos já O encontramos."