Mostrando postagens com marcador reforma íntima. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador reforma íntima. Mostrar todas as postagens

sábado, 31 de março de 2018

A ÚLTIMA CEIA


A tradição católica celebra a Paixão, Morte e a ressurreição de Jesus Cristo, em cerimoniais litúrgicos que em data definida no calendário católico, conhecida como Semana Santa. O Domingo de Páscoa, nessa tradição, é dedicado à celebração da ressurreição de Jesus, simbolizando, sobretudo, a vitória da vida sobre a morte.

A Páscoa judaica é uma das celebrações mais significativas para o povo judeu, pois marca a libertação dos hebreus da escravidão no Egito, que se estendeu por aproximadamente quatrocentos anos. Notavelmente, os últimos dias de Jesus na Terra coincidiram com as festividades dessa Páscoa judaica

Jerusalém era uma cidade santa para o povo judeu, pois abrigava o grandioso Templo de Salomão, onde se realizavam as principais cerimônias religiosas. Por essa razão, durante as celebrações, a cidade se enchia de peregrinos. Pessoas de toda a Palestina partiam em romaria rumo a Jerusalém para participar das festividades da Páscoa, que se estendiam por oito dias.

No entanto, naqueles dias, Jesus, que era judeu, estava ausente de Jerusalém. Ele havia se dirigido com seus discípulos para Betânia, atendendo ao chamado de amigos muito queridos: Marta e Maria, irmãs de Lázaro.

As irmãs enviaram mensagem a Jesus, implorando sua presença, pois Lázaro estava gravemente doente (João 11, 1-3). Jesus, ao chegar em Betânia, descobre que Lázaro já estava no sepulcro há quatro dias e que seu corpo já exalava mau odor (João 11, 39)

Jesus, diante de um expressivo número de testemunhas, dirigiu-se ao sepulcro e ordenou: "Lázaro, sai para fora!" (João 11:43). Esse foi o milagre mais notável realizado por Ele. As pessoas presentes ficaram perplexas e maravilhadas. Nunca antes na história alguém havia feito algo semelhante. A notícia desse fenômeno espalhou-se rapidamente por toda a Palestina. Muitos viajaram até Betânia para verificar os fatos e se depararam com a extraordinária realidade: Lázaro estava vivo!

Jesus retorna a Jerusalém, cidade que estava repleta de pessoas devido às comemorações da Páscoa. Ao saber que Jesus estava a caminho de Jerusalém (João 12:12), o povo, em êxtase, entoou hinos e salmos, lançando ramos de palmeiras ao chão para criar um tapete verde em homenagem à passagem do rei. Após o milagre da ressurreição de Lázaro, o povo não tinha mais dúvidas: Jesus era o rei, o Messias esperado que viria para libertar os judeus do domínio romano.

Jesus entra na cidade, mas não da maneira tradicional da época, quando os reis, após vencerem guerras, faziam sua entrada triunfal montados em cavalos e corcéis majestosos. Jesus, o Príncipe da Paz, adentra a cidade montado em um jumento, simbolizando que sua vitória é sobre o mundo e que seu reino é fundamentado no amor e na paz.

Os fariseus já haviam decidido que Jesus deveria morrer (João 11:53-57), mas não se atreveram a prendê-lo diante do povo em êxtase. Era necessário capturá-lo em um momento de isolamento. Jesus, ciente de sua situação, não evitava os fariseus e sabia que sua hora de partir estava próxima (João 11:1). No entanto, Ele tinha um desejo ardente de celebrar a última ceia da Páscoa com seus discípulos (Lucas 22:11). Por isso, buscava um local seguro para se reunir com eles, longe dos olhares e mira farisaica. 

Jesus, então, envia Pedro e João às portas da cidade com uma missão: encontrar um homem carregando um cântaro. Esse homem os conduziria até sua casa, onde celebrariam a última ceia. O homem do cântaro, uma figura misteriosa cujo nome e origem não são registrados nos evangelhos, generosamente ofereceu sua casa para que Jesus e seus discípulos realizassem a celebração (Lucas 22:8-13). 

A última ceia, também conhecida como a ceia da Páscoa, nos legou inúmeros ensinamentos. A descrição desse momento nos quatro evangelhos é repleta de conteúdo espiritual, tão vasto que é desafiador enumerar todos os pontos sem tornar a leitura exaustiva. 

Por isso, selecionamos três tópicos para uma breve reflexão.

1- Na última ceia, Jesus anunciou a vinda do Consolador prometido, interpretado por alguns como a doutrina espírita. Conforme João 14:15-26: "Se me amais, guardai os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre." (João 14:15) "Mas o Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito." (João 14:26). 

A doutrina espírita não foi concebida pelos homens do mundo, mas revelada ao mundo pelas vozes celestiais. Allan Kardec foi o instrumento escolhido por Jesus para codificar os ensinamentos oriundos do além. Da mesma forma que Moisés recebeu os Dez Mandamentos diretamente dos céus, Allan Kardec, com a ajuda de diversos médiuns, recebeu das esferas sublimes, cumprindo-lhe apenas sistematizar e codificar os conteúdos transmitidos pelos espíritos. 

O espiritismo representa a concretização da promessa feita por Jesus naquela última ceia. Pois, após Ele, nenhuma outra doutrina religiosa ou filosófica chegou à Terra proveniente dos céus.

O espiritismo reaviva os ensinamentos do Cristo, fornecendo a chave para a interpretação de diversos textos que, à primeira vista, parecem enigmáticos. Isso porque, naquela época, o mundo ainda não estava preparado para compreender todos os ensinamentos transmitidos pelo Senhor.

Foi necessário que a humanidade progredisse em conhecimentos filosóficos e científicos para adentrar nos ensinamentos profundos ministrados pelo Cristo. Esse avanço também foi crucial para a compreensão dos temas abordados nas cinco obras que compõem a doutrina espírita: "O Livro dos Espíritos", "A Gênese", "O Livro dos Médiuns", "O Céu e o Inferno" e "O Evangelho Segundo o Espiritismo".

2- Foi também naquela última ceia que Jesus destacou as duas maiores virtudes que a humanidade deve cultivar. Conjugadas nos verbos "amar" e "servir", elas habilitam o ser humano a aspirar à angelitude.

O verdadeiro amor é a manifestação de todas as outras virtudes. Quem ama, perdoa incondicionalmente. Quem ama demonstra paciência, tolerância, misericórdia, mansidão e é, ao mesmo tempo, pacífico e pacificador.

O apóstolo Paulo, ao abordar o tema do amor em sua primeira carta aos Coríntios, fez isso de maneira tão bela e profunda que sua mensagem foi transformada em versos e reverberou pelo mundo.“Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como um bronze que ressoa ou como o prato que retine.  Ainda que eu tenha o dom de profecia e saiba todos os mistérios e todo o conhecimento, e tenha uma fé capaz de mover montanhas, se não tiver amor, nada serei.  Ainda que eu dê aos pobres tudo o que possuo e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, nada disso me valerá.

Naquela última ceia, Jesus disse aos discípulos: "Amai-vos uns aos outros. Não apenas como amais a vós mesmos, mas amai-vos ainda mais, como eu vos amei. Pois os meus discípulos serão reconhecidos por muito amarem." (João 13:34). Um discípulo de Jesus é identificado pela sua capacidade de amar os demais seres do mundo exatamente como eles são.

Deus ama todas as suas criaturas, do verme ao anjo, com igualdade. Seu amor é incondicional, abrangendo tanto o algoz quanto a vítima. No livro "Paulo e Estevão", psicografado por Chico Xavier e ditado pelo espírito Emmanuel, na última página, após o desencarne do apóstolo Paulo, Jesus, acompanhado de Estevão, vai ao encontro do espírito de Paulo. Ele lhe diz que é da vontade do Pai que verdugos e mártires se unam eternamente em Seu reino. O amor é a mais elevada conquista da criatura humana, essencial para a ascensão à angelitude.

No entanto, o amor é verbo que não se conjuga sozinho, pois quem ama serve.

Quando Jesus anunciou, naquela última ceia, sua partida e a iminente chegada do Reino de Deus, os discípulos começaram a debater sobre quem seria o maior nesse Reino. A situação foi descrita em Lucas 22:24-27. Jesus, então, esclareceu-lhes que, no Reino de Deus, o maior será sempre aquele que mais serve, que mais se dedica, e que auxilia a todos sem queixas.

"Amar" e "servir" são dois verbos que, quanto antes soubermos conjugar, mais felicidade e saúde alcançaremos. 

3- Também naquela última ceia, Jesus revelou a traição de Judas e a negação de Pedro. Estes episódios merecem profunda reflexão, pois representam dois arquétipos, dois padrões psíquicos universais intrínsecos à condição humana. Ao expor a negação e a traição diante daquela assembleia, Jesus empregava métodos terapêuticos buscando induzir Pedro e Judas à introspecção. Durante toda a ceia, através de suas palavras e ações, ambos projetavam sombras internas, aspectos ocultos do inconsciente que necessitavam ser trazidos à luz. 

Jesus os convoca a introspecção.

Tendo advertido Pedro, o diálogo com Judas adquiriu maior profundidade. Jesus captava as emanações perturbadoras da atmosfera psíquica de Judas e procurou socorrê-lo, agindo como um professor que facilita o processo de aprendizado do discípulo.

Jesus empenha-se em auxiliar Judas no processo de despertar, permitindo que o discípulo aproveite os últimos momentos ao seu lado e se liberte da letargia que o mantinha preso no mundo

Após anunciar que seria traído e que o traidor seria identificado ao qual desse um pedaço de pão, todos acompanharam o gesto de Jesus em direção a Judas (João 13,26). Todos escutaram quando o Mestre disse a Judas: "Faça logo o que você tem que fazer" (João 13,27). Judas levantou-se e foi negociar com os fariseus a entrega de Jesus. Seria esse o papel destinado a Judas? Era essa a intenção de Jesus em relação a Judas? Será que Judas veio ao mundo com esse propósito?

É óbvio que não. A frase dita por Jesus objetivou o despertar de Judas, com o fim de lembrá-lo de sua missão na Terra. Ninguém tem como missão cometer crimes, erros ou equívocos. Todos nós temos como missão vencer a nós mesmos, superando hábitos e costumes equivocados que adquirimos em encarnações passadas.

Judas estava completamente conectado com as ilusões do mundo material. Ele desejava que Jesus alcançasse o poder terreno. Ele acreditava firmemente que, ao entregar Jesus ao Sinédrio, isso resultaria em uma guerra civil e que sairiam vitoriosos. Isso se devia ao fato de que apenas algumas horas antes, a multidão em Jerusalém havia aclamado Jesus como o rei dos judeus (João 12,13).

Jesus decifra a intimidade de Judas e busca despertá-lo, pois Judas, assim como todos nós, tinha a missão de transformar sua perspectiva em relação ao mundo e a si mesmo.

Judas viveu ao lado de Jesus durante todo o seu ministério de amor. Recebeu o melhor alimento espiritual diretamente da fonte mais pura e, tendo nutrido o espírito, chegou o momento de realizar a tarefa que lhe foi designada.

Da mesma forma, somos como ele. Estamos recebendo alimento espiritual da fonte há quanto tempo? Há quanto tempo nos nutrimos do amor que extraímos das lições de Cristo? Para todos nós também chegou a hora de agir prontamente, realizando aquilo para o qual viemos ao mundo.

Há uma frase que diz que os dias mais importantes de toda nossa vida são dois; o dia em que nascemos e o dia em que descobrimos o porquê nascemos. 

Sabemos que estamos neste mundo com o propósito de evoluir, um objetivo que somente pode ser alcançado através do autoconhecimento. Devemos permitir que as transformações ocorram, sempre utilizando Jesus como nosso ponto de referência, modelo e guia. Ele nos serve como inspiração e direção na busca por nos tornarmos melhores versões de nós mesmos.

Chega o momento para todos nós de realizar esse trabalho de forma rápida, depressa, deixando para trás as ilusões do mundo e voltando-nos para o nosso interior. Já gastamos muito tempo e energia na busca por conquistas materiais que, eventualmente, serão consumidas pelo tempo. Isso é apenas uma questão de tempo!

Assim como Judas, se continuarmos presos a ilusões, também trairíamos Jesus através de nossa inércia. A inércia se configura como traição daqueles que não se movem em direção à transformação moral, sendo que viemos a este mundo justamente para cumprir essa tarefa. Se não agirmos rapidamente para realizar aquilo para o qual viemos, a oportunidade passará, a encarnação passará, e encerraremos nossa jornada com a sensação de falha, acreditando que traímos nosso projeto encarnatório e, ainda mais dolorosamente, que traímos Jesus.

Quando perguntaram a Chico Xavier qual era a maior a dificuldade que os espíritos enfrentam após a morte, respondeu a maior antena psíquica que o mundo já conheceu: A questão mais aflitiva para o espírito no Além é a consciência do tempo perdido.

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

JESUS E O MOÇO RICO


O encontro de Jesus com o moço rico, registrado em Mateus, 19:16 a 24; Lucas, 18:18 a 25; e, Marcos, 10:17 a 25, surge como um autêntico convite à reflexão acerca dos valores que escolhemos para serem o epicentro de nossas existências.

De início, é digno de realce o gesto do jovem rico ao se dirigir ao encontro de Jesus. Estando ele na juventude e gozando de riqueza, pertencia à elite judaica. Em contrapartida, Jesus representava um homem do povo, circulando entre as fileiras da multidão composta por desfavorecidos, enfermos e indivíduos de reputação questionável. 

Naquela época, não era frequente que um homem abastado se entrelaçasse com as massas. Ainda mais incomum era alguém de posição social proeminente, como o jovem rico, procurar o aconselhamento de um homem simples do povo.

Jesus enfrentou intensas críticas e oposições por interagir com aqueles marginalizados pela sociedade daquela época. Como resultado, indivíduos de classes sociais mais elevadas, intelectuais e eruditos evitariam buscar Jesus em público. Caso sentissem a necessidade íntima de se conectar com ele, seguindo o exemplo de Nicodemos, o doutor da lei, procurariam-no sob o manto da noite, buscando o encontro discreto a fim de minimizar a exposição.

O jovem rico, entretanto, transcende a barreira do preconceito e procura Jesus à luz do dia, revelando, por meio desse ato, a magnitude de conflitos e inquietações que carregava consigo.

Ao se aproximar de Jesus, o moço lança imediatamente uma pergunta.


- Bom Mestre, que devo fazer para conseguir a vida eterna?


A pergunta visava a obter uma resposta que desvendasse o caminho para alcançar a paz interior. Afinal, é desafiador compreender por que um jovem rico estaria em busca do significado da vida eterna, a menos que estivesse à procura dessa serenidade profunda.

Jesus fixa o olhar no íntimo do jovem e, antes de responder, lhe esclarece: "Por que me chamas de bom? Não há bom senão um só, que é Deus.”

O Mestre recusa o título de bom e o redireciona para Deus, ilustrando que diante dos desafios do mundo, a busca primordial deve ser direcionada a Deus.

Logo após, Jesus responde ao jovem: "Se desejas alcançar a eternidade, observa os mandamentos: não furtarás, não darás falso testemunho, honra teu pai e tua mãe, não cometerás adultério, entre outros.”

Entretanto, o jovem reage com surpresa, assegurando ter sempre obedecido aos mandamentos. E ele acrescenta, indagando: "O que mais me falta?”

A pergunta evidencia que o jovem, apesar de cumprir os mandamentos conforme a tradição, não experimentava uma realização espiritual completa. Isso reflete uma realidade comum a muitos seres humanos, que mesmo dedicando-se ao estudo do evangelho e ao auxílio ao próximo, não conseguem alcançar a plenitude.

A razão reside no persistente domínio do antigo orgulho, da vaidade arraigada, do egoísmo duradouro e do ciúme enraizado, que continuam a influenciar as dinâmicas das relações humanas.

A realização da plenitude só se torna realizável quando o indivíduo consegue libertar-se de todas as suas falhas morais, sendo este um princípio universal.

Nesse contexto, Jesus indica ao jovem que é necessário ir além do que já havia sido mencionado.


"Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me".

Ao escutar essas palavras, o jovem partiu com tristeza, pois detinha muitas posses. O chamado de Jesus representava uma demanda que ele não estava disposto a aceitar, pois sua afeição por suas posses era forte demais para abdicar delas.

Disse, então, Jesus aos seus discípulos: "em verdade vos digo que é difícil entrar um rico no reino dos céus.  E, outra vez vos digo que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus”.

Essas palavras frequentemente foram mal interpretadas, levando à crença de que Jesus estava condenando a riqueza e os bens materiais.

Contudo, é evidente pelo próprio contexto que Jesus não estava condenando a riqueza, uma vez que os próprios discípulos compreenderam isso e, consequentemente, questionaram: "Nesse caso, quem pode ser salvo?”

Se o Senhor estivesse de fato condenando a riqueza, a pergunta do discípulo - "Quem poderá salvar-se?" - não faria sentido, especialmente porque os discípulos eram pessoas de poucos recursos.

O cerne do texto se concentra no desapego dos bens terrenos, uma qualidade que tanto ricos quanto pobres podem alcançar.

A prática do desapego em relação aos bens materiais abre espaço na disposição interior para o interesse nos valores espirituais.

O propósito do texto é convidar o aprendiz a deslocar o foco dos interesses dos bens materiais para os interesses espirituais no cerne da vida.

A centralização dos interesses na posse de bens materiais levou a uma sociedade profundamente materialista e consumista, com um forte apego aos bens terrenos.

Esse apego aos bens materiais se manifesta de maneira óbvia em diversos momentos, inclusive nos momentos mais simples e cotidianos. Seja na satisfação e alegria ao adquirir novos objetos, na necessidade de exibi-los, ou mesmo na tristeza que surge ao perder um bem.

O materialismo também se evidencia nas ações humanas quando se empenha em múltiplas atividades com fins lucrativos, muitas vezes em detrimento do descanso e do convívio familiar, visando acumular recursos para concretizar um determinado desejo de consumo. Da mesma forma, se manifesta quando sentimentos negativos emergem diante da impossibilidade de adquirir o que se anseia.

O encontro entre Jesus e o jovem rico é um episódio repleto de convites de natureza espiritual. 

O Mestre nos convida a sempre buscar Deus como solução para nossos conflitos; nos convida a empreender uma reforma íntima, eliminando as imperfeições morais que bloqueiam o desenvolvimento de virtudes genuínas; nos chama a praticar o desapego em relação aos bens materiais, e a nutrir valores espirituais, aprimorando nossas interações com os outros.

Isso porque o maior investimento que podemos realizar nesta encarnação reside no domínio dos sentimentos.



terça-feira, 19 de setembro de 2017

A PORTA ESTREITA



Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela (Mateus 7:13)


Na época de Jesus, o povo da Palestina, embora moralmente endurecido, mantinha uma forte adesão e compromisso com os preceitos religiosos presentes na Torá.

Devido a essa orientação, os judeus demonstravam uma profunda reverência pela cidade de Jerusalém, a capital religiosa do judaísmo, considerada sagrada e divina. Isso ocorria principalmente porque lá se encontrava construído o único templo onde eles deveriam adorar a Deus.

Nas datas religiosas, os judeus de toda a Palestina deixavam suas cidades e peregrinavam até a cidade sagrada de Jerusalém para celebrar as festas no templo.

Naquela época, as cidades importantes eram fortificadas e cercadas por altos muros, destinados à sua defesa. O acesso às cidades era possível apenas através de portas ou portões. 

Em Jerusalém, existiam doze portas, cada uma com um propósito específico. Havia uma porta pela qual o lixo da cidade era retirado, a porta central que era utilizada pelos peregrinos em dias de festa, uma porta pela qual os produtos eram trazidos para serem comercializados e, além destas, havia também a porta através da qual as ovelhas eram conduzidas para serem sacrificadas.

Naquela época, os judeus praticavam o sacrifício de animais como uma forma de expressar adoração a Deus. Como muitos judeus eram pastores de ovelhas, eles frequentemente utilizavam esses animais nos rituais sagrados. Durante os dias de festas religiosas, a venda de animais para sacrifício era abundante nas proximidades das portas da cidade.

Os animais destinados ao sacrifício só podiam entrar na cidade por uma porta específica, conhecida como a Porta das Ovelhas ou a Porta do Sacrifício. Essa porta permitia acesso direto à área posterior do templo e era estreita e pequena, tornando difícil a passagem de pessoas. 

Jesus, então, utiliza a simbologia presente na imagem da Porta das Ovelhas, que era estreita e reservada para o sacrifício, para transmitir ensinamentos sobre o processo de transformação moral. 

A porta é um elemento que define a fronteira entre dois espaços e possibilita a passagem de um para outro lado. Ninguém pode transpor uma porta sem se colocar em movimento. 

A reforma íntima é um processo individual que requer que as forças da alma sejam postas em movimento, permitindo abandonar um estágio evolutivo para ascender a outro.

Jesus frequentemente incentivava esse movimento com a frase: "Vai e não peques mais..." 

A porta, simbolicamente usada na lição, possui uma característica peculiar: é estreita. Para atravessá-la, é necessário percorrer o caminho do sacrifício. 

O caminho da transformação moral é estreito e requer sacrifícios, o que faz com que poucos sejam capazes de percorrê-lo. Isso ocorre porque o processo de transformação moral exige a constante disciplina, a renúncia e o desapego.

Para os espíritos que estão acomodados em suas atitudes, a tarefa da reforma íntima parece pesarosa. No entanto, para aqueles que têm boa vontade, esse caminho se torna um roteiro de vida.  

A Terra é um planeta de provas e expiações, e, por isso, oferece aos seus habitantes inúmeras portas largas, que acessam o mundo exterior das ilusões e das seduções, verdadeiras possibilidades de se adensar as próprias imperfeições morais, como o orgulho, vaidade, egoísmo, viciações, hábitos equivocados etc.

A porta estreita, por outro lado, leva ao caminho da plenitude. 

No entanto, para atravessá-la, é essencial possuir a disposição de olhar para dentro de si mesmo, mantendo a prática constante da oração e da vigilância.

O hábito contínuo da oração eleva o nível de vibração espiritual e estabelece uma conexão com esferas mais elevadas, das quais emanam as melhores inspirações para exercer o livre-arbítrio. Além disso, essa prática expande a visão interior, permitindo que o indivíduo identifique as dificuldades internas que carrega na alma. 

Além da oração, é fundamental exercer a vigilância sobre os pensamentos, palavras e sentimentos, uma vez que o que é expresso por meio das palavras, emoções e sentimentos oferece uma melhor compreensão de si mesmo.

A oração e a vigilância são caminhos que facilitam o processo de autoconhecimento. Sem esse autoconhecimento, a pessoa tende a agir sob a influência de sua natureza inferior, suas sombras e conteúdos psíquicos mais densos. A partir disso, a passagem pela porta larga se torna uma questão de oportunidade. 

O percurso do autoconhecimento, apesar de desafiador, é o único capaz de guiar o ser humano em direção à felicidade e à perfeição espiritual. Sem a dedicação à renúncia, à superação do interesse pessoal e ao desapego, que são parte integrante do processo do autoconhecimento, é inviável atravessar a porta que, embora estreita, conduz a um novo horizonte - o horizonte da liberdade.




segunda-feira, 31 de julho de 2017

ENDIREITAI OS CAMINHO

O apóstolo João, nas primeiras linhas de seu Evangelho, faz referência a outro João, o Batista. João Batista, precursor de Jesus, assumiu a tarefa de anunciar a vinda do Cristo ao mundo e, consequentemente, a chegada de uma nova era: a era Cristã. 

A vinda de Jesus ao mundo foi um acontecimento transcendental e revolucionário, sobretudo do ponto de vista dos sentimentos, pois nunca mais o mundo foi o mesmo. Tanto é assim que a história humana se dividiu entre antes e depois dele.

Por isso, João Batista, na tarefa que lhe foi confiada por Deus e tocado pelas claridades da Nova Era que já se fazia sentir, conclamava as multidões para o exercício da transformação moral. Utilizava a frase que ficou imortalizada nas páginas do Evangelho: "Endireitai os caminhos". 

O convite de João Batista se fazia urgente. A vinda do Cristo ao mundo pedia renovação. Era preciso lapidar os sentimentos e desintoxicar hábitos doentes, gerados pelas larvas mentais nascidas de pensamentos desarmonizados. Era necessário preparar o solo do coração, pois o agricultor divino iria iniciar seu trabalho. 

Então, João Batista era a voz que clamava no deserto das consciências, propondo a renovação da paisagem íntima, tal como ocorre na natureza com as flores que deixam suas folhas envelhecidas no outono para florescerem radiosas na primavera. Jesus, com sua mensagem de amor incondicional, trouxe a primavera. 

Deixou para o mundo um roteiro de felicidade e os instrumentos luminosos para a edificação de um templo de paz e amor na intimidade dos corações. Trata-se de um trabalho individual e desafiador a todos os espíritos na atual encarnação. 

Vive-se, atualmente, na Terra, um período de grande turbulência moral. Nunca foi tão necessária a reforma íntima. O mundo está sedento de paz e amor, que só poderão existir à medida que brotarem nos corações humanos. O mundo é o reflexo de cada criatura nele encarnada, conforme ensina Emmanuel no livro "Pensamento e Vida". Para que o mundo seja melhor, impõe-se o aprimoramento de cada criatura que nele habita. 

Emmanuel, no livro Caminho, Verdade e Vida, esclarece: 

"Para que alguém sinta a influência santificadora do Cristo, é preciso retificar a estrada em que tem vivido. Muitos choram em veredas do crime, lamentam-se nos resvaladouros do erro sistemático, invocam o céu sem o desapego às paixões avassaladoras do campo material. Em tais condições, não é justo dirigir-se a alma ao Salvador, que aceitou a humilhação e a cruz sem queixas de qualquer natureza. Se queres que Jesus venha santificar as tuas atividades, endireita os caminhos da existência, regenera os teus impulsos. Desfaze as sombras que te rodeiam e senti-Lo-ás, ao teu lado, com a sua bênção". 

Ao utilizar o termo "desfazer as sombras", Emmanuel refere-se ao processo de autoconhecimento, uma tarefa árdua que exige disciplina constante, vontade firme e ânimo forte. É uma missão para várias existências, uma vez que não se consegue facilmente se libertar das sombras acumuladas ao longo dos séculos. Todavia, ainda que o primeiro passo não conduza o ser, de imediato, ao destino desejado, é suficiente para afastá-lo do ponto de partida.


terça-feira, 27 de junho de 2017

A PARÁBOLA DO TESOURO ESCONDIDO E DA PÉROLA DE GRANDE VALOR



O Reino dos céus é semelhante a um tesouro oculto no campo, o qual certo homem, tendo-o achado, torna a esconder, e, transbordante de alegria, vai, vende tudo o que tem, e compra aquele campo" Mateus 13:44. O reino dos céus é semelhante ao homem, negociante, que busca boas pérolas; e, encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo quanto tinha, e comprou-a." Mateus 13:45-46.


 As parábolas apontam duas situações. Na primeira, um homem encontra um tesouro por acaso, pois não o procurava. Feliz com o achado, resolve vender tudo o que tem para adquirir aquele campo e, consequentemente, apossar-se do tesouro. 

Na segunda situação, o homem, um negociante de pérolas, está à procura de uma pérola de grande valor e, ao encontrá-la, vende tudo o que possui para adquiri-la. 

Jesus compara o Reino de Deus a um tesouro de valor incalculável, de modo que todos os outros interesses e prioridades escolhidas para a vida perdem completamente o significado diante do brilho desse tesouro. 

Alguns vivem uma experiência semelhante à do primeiro homem, que encontra o tesouro sem estar à procura dele; mas, ao encontrá-lo, transforma-se e dá um novo rumo à sua própria existência. 

É exatamente assim que acontece o despertar da consciência para a conquista dos valores espirituais. Muitos permanecem no mundo com todas as atenções voltadas exclusivamente para atender às necessidades da vida material, até que uma experiência libertadora lhes toque, despertando-os da anestesiante ilusão com que enfrentavam o mundo e apontando-lhes outro rumo. 

Foi assim com o filho pródigo de outra parábola contada por Jesus (Lucas 15:11-32). O moço desperdiçou bens materiais e a própria saúde para se saciar em atividades mundanas inferiores. Sem conseguir a satisfação que buscava, em um determinado momento de sua vida, ele "cai em si" e, ao fazer isso, passa a mobilizar todas as forças de sua alma para retornar à casa do Pai. 

Saulo de Tarso também vivenciou uma experiência libertadora. Sendo a esperança do farisaísmo, jovem, belo, atleta e poliglota, ele viveu uma experiência cósmica com o Cristo às portas de Damasco. Despertando das trevas exteriores e como alguém que encontra um tesouro sem o estar procurando, ele se transforma no Apóstolo Paulo, o "convertido de Damasco", alterando completamente o rumo de sua vida e abandonando tudo o que tinha para investir no tesouro encontrado. 

Foi assim também com Francisco Bernadone, que, ao despertar para os valores da vida espiritual e encontrar o tesouro que não buscava, deixou tudo para ir em busca dessa riqueza interior, transformando-se no Pobrezinho de Assis.

 O mesmo ocorreu com Maria de Magdala, Zaqueu e muitos outros heróis conhecidos, bem como inúmeros anônimos que, todos os dias e sem estar à procura, encontram seu tesouro escondido e dão um novo rumo à própria vida, felizes por terem despertado para os verdadeiros valores da existência. 

Na segunda situação apresentada na parábola, o homem está ciente da existência de uma pérola de grande valor e a busca ativamente até encontrá-la.

Assim como muitos de nós que já conhecemos o valor do Evangelho do Cristo, mas ainda resistimos a vivencia-lo. 

A proposta expressa na parábola é clara. Para cultivar virtudes e sentimentos nobres na intimidade do coração, é necessária uma tomada de atitude que implique em deixar de lado tudo o que até então era valorizado, direcionando as energias psíquicas para o aprimoramento moral. 

Cada um sabe o que valoriza na vida e para qual direção suas atenções se voltam. Se você não sabe, basta se autoobservar por um dia e logo notará que as forças da alm são mobilizadas para atender a caprichos, ociosidades, futilidades, vaidades, animosidades, feridas emocionais, orgulho, desejo de vingança, e vícios físicos e mentais, entre outros. A proposta da parábola é abandonar todas essas "riquezas" superficiais para cultivar o verdadeiro tesouro que reside dentro de nós. 

O cultivo do tesouro interno passa pela reforma íntima. A questão 919 do Livro dos Espíritos, neste sentido, é esclarecedora, apontando o autoconhecimento como medida prática para se conquistar a paz íntima. 

Jesus fez o convite e a doutrina espírita apontou um caminho, mas somente o esforço pessoal poderá operar a edificação moral, legítima e definitiva em cada um. 

Portanto, "esqueçamos o desperdício de energia, os caprichos da infância espiritual e cresçamos para ser, com o Pai, os tutores de nós mesmos". (Emmanuel, Vinha de Luz)