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sábado, 19 de maio de 2018

PARÁBOLA DAS DEZ VIRGENS



O reino dos céus será semelhante a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram ao encontro do esposo. E cinco delas eram prudentes, e cinco insensatas. As insensatas, tomando as suas lâmpadas, não levaram azeite consigo. Mas as prudentes levaram azeite em suas vasilhas, com as suas lâmpadas. E, tardando o esposo, tosquenejaram todas, e adormeceram. Mas à meia-noite ouviu-se um clamor: Aí vem o esposo, saí-lhe ao encontro. Então todas aquelas virgens se levantaram, e prepararam as suas lâmpadas. E as loucas disseram às prudentes: Dai-nos do vosso azeite, porque as nossas lâmpadas se apagam. Mas as prudentes responderam, dizendo: Não seja caso que nos falte a nós e a vós, ide antes aos que o vendem, e comprai-o para vós. E, tendo elas ido comprá-lo, chegou o esposo, e as que estavam preparadas entraram com ele para as bodas, e fechou-se a porta. E depois chegaram também as outras virgens, dizendo: Senhor, Senhor, abre-nos. E ele, respondendo, disse: Em verdade vos digo que vos não conheço. Vigiai, pois, porque não sabeis nem o dia e nem a hora. Mateus 25, 1-13.

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 Embora muitas interpretações desta parábola tenham um enfoque escatológico, as palavras de Jesus oferecem múltiplas perspectivas. É plenamente possível entendê-la não apenas como uma visão do fim dos tempos, mas também como um convite ao autoconhecimento. 

Ao utilizar elementos de um casamento tradicional judeu como pano de fundo, Jesus destaca a ideia de uma união cósmica e de uma conexão profunda, como um pilar que sustentará todas as outras imagens e mensagens contidas no texto. 

A parábola descreve o encontro de dez virgens com o noivo. Segundo a tradição judaica, durante a cerimônia de casamento, a noiva era acompanhada por suas amigas no trajeto até o noivo. Este, por sua vez, também caminhava em direção à casa da noiva, ladeado por seus amigos. 

No entanto, na parábola, Jesus omite qualquer menção à noiva, focando apenas em suas amigas, as virgens. Isso se dá porque Jesus não alude a um casamento terreno, mas sim à união entre a humanidade — o Seu rebanho — e Ele mesmo, o divino pastor..

Simbolicamente, Jesus é retratado como o noivo da humanidade, conforme evidenciado em Mateus 9:14-17. Essa representação também é reforçada na resposta à questão 309 do livro "O Consolador", ditado pelo espírito Emmanuel e psicografado por Chico Xavier.

Um dos pontos centrais da parábola é a analogia do reino dos céus com as dez virgens que se dirigem ao encontro do noivo. Jesus frequentemente se referiu ao "reino dos céus", utilizando diversas metáforas e elementos cotidianos da vida do povo judeu para facilitar a compreensão. Em Lucas 17:20-21, o Mestre clarifica sua mensagem, declarando que o reino não se localiza externamente, mas reside no interior de cada indivíduo. Isso sublinha que o "reino dos céus" não é um lugar físico, mas sim um estado interno de harmonia, equilíbrio e regência pelo amor incondicional.

É fascinante observar que as virgens, quando comparadas ao reino dos céus, avançam em direção ao noivo. Isso sugere que esse estado interno de harmonia, equilíbrio e domínio pelo amor incondicional não é algo passivamente recebido, mas sim uma conquista ativa. Está intrinsecamente ligado aos movimentos e esforços da alma em sua jornada evolutiva. 

Destaca-se, neste prisma, os movimentos pelo autoconhecimento. Sem essa introspecção e esforço consciente, é impossível transformar emoções e sentimentos desequilibrados em estados mais harmoniosos.

A escolha do número dez na parábola também é significativa. Na tradição judaica, os números carregam profundos significados simbólicos. O número dez, em particular, representa perfeição e totalidade. Assim, as dez virgens podem ser vistas como um símbolo da busca completa e perfeita pela harmonia interior e pelo amor incondicional.

Na parábola, as dez virgens não representam uma unidade perfeita e coesa, pois enquanto metade delas é descrita como prudente, a outra metade é caracterizada como imprudente. Assim, a imagem das dez virgens ilustra uma totalidade que, apesar de completa, possui suas metades em desequilíbrio.

Esta analogia pode ser estendida à humanidade atualmente encarnada no planeta. Em um mundo de provas e expiações como o nosso, o psiquismo humano, devido aos seus inúmeros conflitos internos, apresenta-se fragmentado. Existe uma parte de nós que é consciente e conhecida, enquanto outra permanece oculta e misteriosa. Há uma faceta que age com prudência e discernimento, e outra que pode ser impulsiva e até assustadora. Da mesma forma, enquanto uma parte de nós consegue controlar e dominar nossas tendências, a outra pode estar repleta de imperfeições e vícios que, por vezes, sobrepõem-se à nossa razão. Esta dualidade reflete a contínua luta interna que muitos enfrentam em sua jornada espiritual e evolutiva.

Joana de Angelis, através da série psicológica psicografada por Divaldo Franco, faz alusão ao pensamento de Carl Jung para elucidar aspectos profundos da psique humana. Segundo essa perspectiva, a parte desconhecida da personalidade abriga conteúdos psíquicos que o EU (ou SELF, conforme a terminologia junguiana) não reconhece conscientemente. Estes conteúdos estão armazenados no que é chamado de inconsciente profundo.

Este repositório oculto do inconsciente muitas vezes exerce uma influência poderosa sobre nossas ações e decisões, levando-nos, em certas ocasiões, a agir de maneiras que nos surpreendem e até mesmo contradizem nosso entendimento consciente de nós mesmos. É como se houvesse uma força interna, muitas vezes não reconhecida, que direciona certos aspectos de nossa vida.

Dada a influência profunda e, por vezes, misteriosa do inconsciente sobre o comportamento humano, não é surpreendente que o autoconhecimento tenha sido um tema recorrente nas parábolas de Jesus. Ele enfatizou a importância de olhar para dentro, de reconhecer e integrar todas as partes de nós mesmos, para viver uma vida mais plena e alinhada com o amor e a verdade divinos. 

Outro aspecto marcante da parábola é o sono que acomete todas as virgens. Mesmo estando equipadas com suas lamparinas, em determinado ponto da espera pelo noivo, todas adormecem devido à sua demora.

O sono, neste contexto, pode ser interpretado como uma metáfora para a inércia espiritual. Representa a estagnação e a inatividade do espírito, simbolizando a ausência do esforço contínuo e necessário para o autoconhecimento. Esse estado de "sono" reflete o comodismo, o desinteresse e o descaso na jornada de despertar da consciência. É uma postura passiva diante da vida e da evolução espiritual.

Essa inércia, simbolizada pelo sono, prende o ser humano ao estágio evolutivo em que se encontra, atuando como uma espécie de anestesia para a vontade e o ímpeto de crescimento. Em vez de avançar e buscar a iluminação e o entendimento, a alma permanece adormecida, perdendo oportunidades valiosas de evolução e aprendizado.

O momento em que as virgens são despertadas pela chegada inesperada do noivo é, sem dúvida, o clímax da parábola. Jesus, em sua maestria, utiliza simbolismos profundos e transcendentais para transmitir seus ensinamentos. A chegada do noivo à meia-noite não é um detalhe trivial. A meia-noite, marcada pelo encontro dos ponteiros do relógio, simboliza o fim de um ciclo e o início de outro. 

Dentro desse contexto, a chegada do noivo nesse momento específico sugere que o despertar espiritual pode ocorrer justamente quando menos esperamos, no limiar entre duas fases de nossa existência. É um lembrete de que a oportunidade para a transformação e o crescimento espiritual pode surgir a qualquer momento, e que devemos estar sempre preparados e vigilantes para recebê-la.

Nas cartas de Paulo aos Romanos, capítulo 13, versos 11-12, destaca-se a advertência do apóstolo do Cristo: “Reconheceis o momento em que viveis, já é hora de despertar do sono. A noite está avançada, o dia se aproxima. Rejeitemos, pois, as obras das trevas, e vistamo-nos das armas da luz.”

A parábola aponta para o despertar da consciência, porque a humanidade já se encontra em condições de realizá-la. Ao despertarem, as virgens percebem que não podem mais seguir juntas, porque durante o sono suas lamparinas se apagaram e metade delas não tinha azeite suficiente para mantê-las acesas.

 As virgens insensatas representam as máscaras que criamos para sustentar nossas pseudo-virtudes. Quando o ser humano não busca o autoconhecimento, quando se recusa a aceitar-se, quando não se perdoa, alimenta para si falsas virtudes, numa tentativa ilusória de compensar-se, acreditando ser o que não é. 

Todo movimento ilusório, do ponto de vista psicológico, um dia perde o combustível e não consegue sustentar-se, levando o ser a experimentar, muitas vezes, um despertar doloroso, como aconteceu com as virgens que, só então, perceberam o quanto se equivocaram.

Surge, novamente, a necessidade de se autodescobrir, para o trabalho de transformação moral, abandonando as máscaras e todos os outros artifícios psicológicos que evitam o despertar da consciência, rumo a plenitude espiritual.

Por fim, pondere-se que a separação das virgens, retrata a divisão de um todo. No caso da parábola, metade luz, metade trevas. Neste aspecto, já advertira o Cristo: “Todo reino dividido contra si mesmo será destruído. Toda cidade, toda casa dividida contra si mesma não pode subsistir”. Mateus 12:25.

Jesus termina a parábola recomendando orai e vigiai porque não sabemos o dia e a hora.

Aproveitar a encarnação para o exercício do autoconhecimento é missão de todos aqueles que buscam os patamares superiores da vida. O relógio da imortalidade já marcou meia noite. É chegada a hora!




 

 

sábado, 31 de março de 2018

A ÚLTIMA CEIA


A tradição católica celebra a Paixão, Morte e a ressurreição de Jesus Cristo, em cerimoniais litúrgicos que em data definida no calendário católico, conhecida como Semana Santa. O Domingo de Páscoa, nessa tradição, é dedicado à celebração da ressurreição de Jesus, simbolizando, sobretudo, a vitória da vida sobre a morte.

A Páscoa judaica é uma das celebrações mais significativas para o povo judeu, pois marca a libertação dos hebreus da escravidão no Egito, que se estendeu por aproximadamente quatrocentos anos. Notavelmente, os últimos dias de Jesus na Terra coincidiram com as festividades dessa Páscoa judaica

Jerusalém era uma cidade santa para o povo judeu, pois abrigava o grandioso Templo de Salomão, onde se realizavam as principais cerimônias religiosas. Por essa razão, durante as celebrações, a cidade se enchia de peregrinos. Pessoas de toda a Palestina partiam em romaria rumo a Jerusalém para participar das festividades da Páscoa, que se estendiam por oito dias.

No entanto, naqueles dias, Jesus, que era judeu, estava ausente de Jerusalém. Ele havia se dirigido com seus discípulos para Betânia, atendendo ao chamado de amigos muito queridos: Marta e Maria, irmãs de Lázaro.

As irmãs enviaram mensagem a Jesus, implorando sua presença, pois Lázaro estava gravemente doente (João 11, 1-3). Jesus, ao chegar em Betânia, descobre que Lázaro já estava no sepulcro há quatro dias e que seu corpo já exalava mau odor (João 11, 39)

Jesus, diante de um expressivo número de testemunhas, dirigiu-se ao sepulcro e ordenou: "Lázaro, sai para fora!" (João 11:43). Esse foi o milagre mais notável realizado por Ele. As pessoas presentes ficaram perplexas e maravilhadas. Nunca antes na história alguém havia feito algo semelhante. A notícia desse fenômeno espalhou-se rapidamente por toda a Palestina. Muitos viajaram até Betânia para verificar os fatos e se depararam com a extraordinária realidade: Lázaro estava vivo!

Jesus retorna a Jerusalém, cidade que estava repleta de pessoas devido às comemorações da Páscoa. Ao saber que Jesus estava a caminho de Jerusalém (João 12:12), o povo, em êxtase, entoou hinos e salmos, lançando ramos de palmeiras ao chão para criar um tapete verde em homenagem à passagem do rei. Após o milagre da ressurreição de Lázaro, o povo não tinha mais dúvidas: Jesus era o rei, o Messias esperado que viria para libertar os judeus do domínio romano.

Jesus entra na cidade, mas não da maneira tradicional da época, quando os reis, após vencerem guerras, faziam sua entrada triunfal montados em cavalos e corcéis majestosos. Jesus, o Príncipe da Paz, adentra a cidade montado em um jumento, simbolizando que sua vitória é sobre o mundo e que seu reino é fundamentado no amor e na paz.

Os fariseus já haviam decidido que Jesus deveria morrer (João 11:53-57), mas não se atreveram a prendê-lo diante do povo em êxtase. Era necessário capturá-lo em um momento de isolamento. Jesus, ciente de sua situação, não evitava os fariseus e sabia que sua hora de partir estava próxima (João 11:1). No entanto, Ele tinha um desejo ardente de celebrar a última ceia da Páscoa com seus discípulos (Lucas 22:11). Por isso, buscava um local seguro para se reunir com eles, longe dos olhares e mira farisaica. 

Jesus, então, envia Pedro e João às portas da cidade com uma missão: encontrar um homem carregando um cântaro. Esse homem os conduziria até sua casa, onde celebrariam a última ceia. O homem do cântaro, uma figura misteriosa cujo nome e origem não são registrados nos evangelhos, generosamente ofereceu sua casa para que Jesus e seus discípulos realizassem a celebração (Lucas 22:8-13). 

A última ceia, também conhecida como a ceia da Páscoa, nos legou inúmeros ensinamentos. A descrição desse momento nos quatro evangelhos é repleta de conteúdo espiritual, tão vasto que é desafiador enumerar todos os pontos sem tornar a leitura exaustiva. 

Por isso, selecionamos três tópicos para uma breve reflexão.

1- Na última ceia, Jesus anunciou a vinda do Consolador prometido, interpretado por alguns como a doutrina espírita. Conforme João 14:15-26: "Se me amais, guardai os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre." (João 14:15) "Mas o Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito." (João 14:26). 

A doutrina espírita não foi concebida pelos homens do mundo, mas revelada ao mundo pelas vozes celestiais. Allan Kardec foi o instrumento escolhido por Jesus para codificar os ensinamentos oriundos do além. Da mesma forma que Moisés recebeu os Dez Mandamentos diretamente dos céus, Allan Kardec, com a ajuda de diversos médiuns, recebeu das esferas sublimes, cumprindo-lhe apenas sistematizar e codificar os conteúdos transmitidos pelos espíritos. 

O espiritismo representa a concretização da promessa feita por Jesus naquela última ceia. Pois, após Ele, nenhuma outra doutrina religiosa ou filosófica chegou à Terra proveniente dos céus.

O espiritismo reaviva os ensinamentos do Cristo, fornecendo a chave para a interpretação de diversos textos que, à primeira vista, parecem enigmáticos. Isso porque, naquela época, o mundo ainda não estava preparado para compreender todos os ensinamentos transmitidos pelo Senhor.

Foi necessário que a humanidade progredisse em conhecimentos filosóficos e científicos para adentrar nos ensinamentos profundos ministrados pelo Cristo. Esse avanço também foi crucial para a compreensão dos temas abordados nas cinco obras que compõem a doutrina espírita: "O Livro dos Espíritos", "A Gênese", "O Livro dos Médiuns", "O Céu e o Inferno" e "O Evangelho Segundo o Espiritismo".

2- Foi também naquela última ceia que Jesus destacou as duas maiores virtudes que a humanidade deve cultivar. Conjugadas nos verbos "amar" e "servir", elas habilitam o ser humano a aspirar à angelitude.

O verdadeiro amor é a manifestação de todas as outras virtudes. Quem ama, perdoa incondicionalmente. Quem ama demonstra paciência, tolerância, misericórdia, mansidão e é, ao mesmo tempo, pacífico e pacificador.

O apóstolo Paulo, ao abordar o tema do amor em sua primeira carta aos Coríntios, fez isso de maneira tão bela e profunda que sua mensagem foi transformada em versos e reverberou pelo mundo.“Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como um bronze que ressoa ou como o prato que retine.  Ainda que eu tenha o dom de profecia e saiba todos os mistérios e todo o conhecimento, e tenha uma fé capaz de mover montanhas, se não tiver amor, nada serei.  Ainda que eu dê aos pobres tudo o que possuo e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, nada disso me valerá.

Naquela última ceia, Jesus disse aos discípulos: "Amai-vos uns aos outros. Não apenas como amais a vós mesmos, mas amai-vos ainda mais, como eu vos amei. Pois os meus discípulos serão reconhecidos por muito amarem." (João 13:34). Um discípulo de Jesus é identificado pela sua capacidade de amar os demais seres do mundo exatamente como eles são.

Deus ama todas as suas criaturas, do verme ao anjo, com igualdade. Seu amor é incondicional, abrangendo tanto o algoz quanto a vítima. No livro "Paulo e Estevão", psicografado por Chico Xavier e ditado pelo espírito Emmanuel, na última página, após o desencarne do apóstolo Paulo, Jesus, acompanhado de Estevão, vai ao encontro do espírito de Paulo. Ele lhe diz que é da vontade do Pai que verdugos e mártires se unam eternamente em Seu reino. O amor é a mais elevada conquista da criatura humana, essencial para a ascensão à angelitude.

No entanto, o amor é verbo que não se conjuga sozinho, pois quem ama serve.

Quando Jesus anunciou, naquela última ceia, sua partida e a iminente chegada do Reino de Deus, os discípulos começaram a debater sobre quem seria o maior nesse Reino. A situação foi descrita em Lucas 22:24-27. Jesus, então, esclareceu-lhes que, no Reino de Deus, o maior será sempre aquele que mais serve, que mais se dedica, e que auxilia a todos sem queixas.

"Amar" e "servir" são dois verbos que, quanto antes soubermos conjugar, mais felicidade e saúde alcançaremos. 

3- Também naquela última ceia, Jesus revelou a traição de Judas e a negação de Pedro. Estes episódios merecem profunda reflexão, pois representam dois arquétipos, dois padrões psíquicos universais intrínsecos à condição humana. Ao expor a negação e a traição diante daquela assembleia, Jesus empregava métodos terapêuticos buscando induzir Pedro e Judas à introspecção. Durante toda a ceia, através de suas palavras e ações, ambos projetavam sombras internas, aspectos ocultos do inconsciente que necessitavam ser trazidos à luz. 

Jesus os convoca a introspecção.

Tendo advertido Pedro, o diálogo com Judas adquiriu maior profundidade. Jesus captava as emanações perturbadoras da atmosfera psíquica de Judas e procurou socorrê-lo, agindo como um professor que facilita o processo de aprendizado do discípulo.

Jesus empenha-se em auxiliar Judas no processo de despertar, permitindo que o discípulo aproveite os últimos momentos ao seu lado e se liberte da letargia que o mantinha preso no mundo

Após anunciar que seria traído e que o traidor seria identificado ao qual desse um pedaço de pão, todos acompanharam o gesto de Jesus em direção a Judas (João 13,26). Todos escutaram quando o Mestre disse a Judas: "Faça logo o que você tem que fazer" (João 13,27). Judas levantou-se e foi negociar com os fariseus a entrega de Jesus. Seria esse o papel destinado a Judas? Era essa a intenção de Jesus em relação a Judas? Será que Judas veio ao mundo com esse propósito?

É óbvio que não. A frase dita por Jesus objetivou o despertar de Judas, com o fim de lembrá-lo de sua missão na Terra. Ninguém tem como missão cometer crimes, erros ou equívocos. Todos nós temos como missão vencer a nós mesmos, superando hábitos e costumes equivocados que adquirimos em encarnações passadas.

Judas estava completamente conectado com as ilusões do mundo material. Ele desejava que Jesus alcançasse o poder terreno. Ele acreditava firmemente que, ao entregar Jesus ao Sinédrio, isso resultaria em uma guerra civil e que sairiam vitoriosos. Isso se devia ao fato de que apenas algumas horas antes, a multidão em Jerusalém havia aclamado Jesus como o rei dos judeus (João 12,13).

Jesus decifra a intimidade de Judas e busca despertá-lo, pois Judas, assim como todos nós, tinha a missão de transformar sua perspectiva em relação ao mundo e a si mesmo.

Judas viveu ao lado de Jesus durante todo o seu ministério de amor. Recebeu o melhor alimento espiritual diretamente da fonte mais pura e, tendo nutrido o espírito, chegou o momento de realizar a tarefa que lhe foi designada.

Da mesma forma, somos como ele. Estamos recebendo alimento espiritual da fonte há quanto tempo? Há quanto tempo nos nutrimos do amor que extraímos das lições de Cristo? Para todos nós também chegou a hora de agir prontamente, realizando aquilo para o qual viemos ao mundo.

Há uma frase que diz que os dias mais importantes de toda nossa vida são dois; o dia em que nascemos e o dia em que descobrimos o porquê nascemos. 

Sabemos que estamos neste mundo com o propósito de evoluir, um objetivo que somente pode ser alcançado através do autoconhecimento. Devemos permitir que as transformações ocorram, sempre utilizando Jesus como nosso ponto de referência, modelo e guia. Ele nos serve como inspiração e direção na busca por nos tornarmos melhores versões de nós mesmos.

Chega o momento para todos nós de realizar esse trabalho de forma rápida, depressa, deixando para trás as ilusões do mundo e voltando-nos para o nosso interior. Já gastamos muito tempo e energia na busca por conquistas materiais que, eventualmente, serão consumidas pelo tempo. Isso é apenas uma questão de tempo!

Assim como Judas, se continuarmos presos a ilusões, também trairíamos Jesus através de nossa inércia. A inércia se configura como traição daqueles que não se movem em direção à transformação moral, sendo que viemos a este mundo justamente para cumprir essa tarefa. Se não agirmos rapidamente para realizar aquilo para o qual viemos, a oportunidade passará, a encarnação passará, e encerraremos nossa jornada com a sensação de falha, acreditando que traímos nosso projeto encarnatório e, ainda mais dolorosamente, que traímos Jesus.

Quando perguntaram a Chico Xavier qual era a maior a dificuldade que os espíritos enfrentam após a morte, respondeu a maior antena psíquica que o mundo já conheceu: A questão mais aflitiva para o espírito no Além é a consciência do tempo perdido.

domingo, 5 de março de 2017

JESUS E JUDAS


Reunido com os discípulos durante a última ceia, Jesus anunciou que seria traído ainda naquela noite por um dos presentes à mesa. O clima de despedida que permeava o banquete foi abruptamente interrompido, dando lugar a uma desconfiança mútua entre os discípulos sobre quem seria o "traidor".

Diante do impacto causado por sua revelação, o Mestre optou por ser indireto e afirmou que o traidor seria aquele a quem ele oferecesse um pedaço de pão. O Evangelho de João, no capítulo 13, versículos 26 e 27, relata que Jesus entregou o pão a Judas, dizendo: "O que tens para fazer, faze-o logo". Judas, após comer o pão oferecido por Jesus, levantou-se e saiu.

A frase é intrigante e tem gerado diversas especulações entre os estudiosos do Evangelho. O que Jesus quis dizer a Judas ao instruí-lo a agir rapidamente? Naquela mesma noite, poucas horas após a ceia, Jesus seria preso. Ele estava ciente de tudo que estava sendo tramado às suas costas, graças às suas habilidades anímicas, incluindo a clarividência. Ele sabia do envolvimento de Judas com Caifás. Então, por que pediu que Judas agisse depressa?

Muitas questões surgem a partir do texto. Jesus estaria incentivando Judas à traição? Judas reencarnou apenas para trair Jesus e passar milênios sendo odiado pela humanidade? E quanto à lei do livre-arbítrio e à responsabilidade de Judas perante a lei divina? Afinal, após trair Jesus, Judas se suicidou.

Para uma compreensão espiritual e profunda do texto, é imprescindível transcender a leitura superficial. Sabendo que seu tempo na Terra estava chegando ao fim, Jesus tentou despertar Judas para os aspectos sombrios de seu inconsciente. Era uma estratégia terapêutica, visando levar o discípulo a se autoexaminar e confrontar sua própria "sombra".

A "sombra" é um termo que define os aspectos negativos do inconsciente, as imperfeições morais ainda desconhecidas pelo indivíduo, mas armazenadas em seu interior. Para a evolução consciente é crucial integrar e harmonizar os aspectos sombrios do próprio ser.

Judas, como muitos seres humanos, estava preso às suas imperfeições morais. Sua sombra mais densa ocultava uma paixão indomável pelo poder material e efêmero. Embora todos os outros discípulos também tivessem imperfeições a superar, as falhas morais de Judas o levaram a cometer um grave erro contra si mesmo: o suicídio.

O que Judas tinha a fazer? Para que ele nasceu? Ele viveu ao lado de Jesus durante todo o seu ministério, recebendo ensinamentos que edificam a alma. Aquele momento final era crucial para Judas; era a hora de enfrentar seus demônios internos e vencer a si mesmo. Se tivesse optado por seguir os ensinamentos de Cristo, teria cumprido sua missão. No entanto, escolheu o caminho do sofrimento.

"O que tens para fazer, faze-o logo." 

Há uma frase popular que diz que os dias mais importantes de nossas vidas são dois: o dia em que você nasceu e o dia em você que descobre para que nasceu. Os espíritas sabem que nasceram para evoluir moral e espiritualmente, mas essa evolução exige a superação das imperfeições morais. E Jesus nos insta a agir rapidamente naquilo para o qual viemos ao mundo.

O momento presente é o melhor de todos, pois se não aproveitado, a oportunidade e a encarnação passam, como um rio que flui e não retorna. 

Chico Xavier frequentemente nos advertiu que, segundo os espíritos, um dos dilemas mais angustiantes enfrentados ao adentrar o mundo espiritual é a dolorosa consciência do tempo desperdiçado em vida.

Pensemos nisso! Afinal, a oportunidade de crescimento e transformação está sempre ao nosso alcance, mas é nossa responsabilidade agarrá-la antes que o tempo se esgote.

terça-feira, 26 de maio de 2015

JESUS E A MULHER SAMARITANA


O Evangelho de João 4, 5-15 narra o encontro de Jesus com uma mulher Samaritana na cidade de Sicar, na região da Samaria, cujo diálogo está repleto de conteúdos espirituais. Ao chegar na cidade da Samaria, chamada Sicar, Jesus, cansado da longa caminhada vinda de Jerusalém rumo a Galileia, se senta à beira do poço de Jacó para descansar, por volta do meio-dia.

Este quadro é simbólico. A imagem de Jesus, detentor de toda a sabedoria, sentado à beira de um poço, representa a ideia de um mestre à disposição de quem se propõe a aprender com Ele. A mulher que vai ao poço buscar água expressa o movimento do ser humano que, cansado das superficialidades da vida, procura um sentido mais profundo para a própria existência. A fonte, ou o poço, adquire uma simbologia que aponta para o conhecimento. E, é por isso, que a mulher que vai à fonte para saciar sua sede é convidada por Jesus a despertar para o amor próprio.

Ao se aproximar do poço com um jarro em suas mãos para colher a água, Jesus surpreende a mulher, dizendo-lhe: 'Dá-me de beber.' A mulher, surpresa, responde ao Mestre: 'Como sendo tu judeu, me pedes de beber, a mim, que sou mulher samaritana?' (Porque os judeus não se comunicam com os samaritanos).

A proposta de Jesus - 'Dá-me de beber' – é um convite. O Mestre a convida a estabelecer um relacionamento com Ele para iniciar seu aprendizado da Verdade. Mas ela, num primeiro momento, ao invés de estar receptiva ao convite, não O entende, pois embora estivesse pronta para o despertamento, ainda se prendia às questões superficiais da vida.

Jesus propõe à mulher uma comunhão, mas ela permanece ligada às questões culturais de seu tempo e de seu povo, focada nas aparências preconceituosas. Esse é exatamente o perfil da superficialidade.

A mulher Samaritana queria permanecer nas discussões estéreis da superficialidade, por isso questiona: 'Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana?' O que importava para ela era a rixa entre os povos e não o convite de Jesus. Ela resiste a ter intimidade com Ele. Apesar de sua necessidade, ela reluta em aceitar o convite ao aprendizado.

No nosso plano, somos constantemente convidados por Deus a assumirmos as rédeas do processo evolutivo, trabalhando pelo próprio aprimoramento moral. No entanto, muitos preferem permanecer no plano da superficialidade.

A mulher, estranhando o pedido de Jesus, responde a Ele que os Judeus não deveriam falar com Samaritanos. Jesus então lhe disse: 'Se tu soubesses quem Sou, era tu que me pedirias água, e a água viva que eu te desse, tu jamais padecerias sede.'

Ao oferecer água viva à mulher, Jesus reforça a Sua condição de Mestre, convidando-a mais uma vez à comunhão com Ele.

A mulher, por sua vez, responde: 'Senhor, tu não tens com que a tirar, e o poço é fundo; onde, pois, conseguirá a água viva?

Sabe-se que água viva é a água mais pura e cristalina que permanece no fundo de qualquer poço. Quando o Mestre oferece água viva, Ele está propondo um mergulho interior, com o propósito do autoconhecimento. Isto porque, conforme ensina o Livro dos Espíritos, nas questões 919 e 919ª, o autoconhecimento é ferramenta eficaz de evolução. 

O autoconhecimento permite que se cuide das próprias feridas, sem ocultá-las de si mesmo. Durante o processo, é possível reconhecer os acertos e os erros praticados na vida, compreendendo que se os acertos impulsionam o ser para frente, os erros também o fazem quando o ser se compromete a refletir sobre seus atos, com o fim de aprender e repará-los. 

O aprendiz da Vida não estaciona na superficialidade, mas aprofunda-se dentro de si. Em vez de se entristecer com as limitações que encontra, regozija-se com isso, e, notando uma ferida interna, ao invés de disfarçá-la com uma pomada anestesiante, recorre ao unguento do amor para curá-la.

Ao ouvir a proposta de Jesus de que Ele poderia lhe dar água viva, a mulher questionou se Ele era maior do que Jacó, que havia dado àquele povo o poço de onde eles tiravam água.

Jesus, porém, sem dizer se era ou não maior que Jacó, respondeu à mulher que qualquer um que bebesse da água do poço de Jacó voltaria a ter sede, mas aquele que bebesse da água que Ele dava jamais padeceria sede, porque a água dada por Jesus se tornaria uma fonte jorrando para a vida eterna.

A expressão "água viva que sacia a sede" corresponde à frase dita por Cristo em João 8:32: "conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará." O espírito, livre de suas amarras internas, está pronto para o exercício do amor e do amor próprio.

A mulher, então, lhe pediu: "Senhor, dá-me dessa água para que eu não tenha mais sede e não precise mais vir até esse poço para tirá-la.

A samaritana ainda resistia ao aprendizado com Jesus ao confundir a "água viva" com a água do poço. Jesus estava falando com ela sobre a sede do espírito, não a sede do corpo. A tentativa de aplacar a sede da alma com coisas materiais é um movimento ilusório do ser equivocado, porque, em vez de saciar-se, encontrará-se ainda mais sedento.

Jesus, com o objetivo de despertá-la, ordenou: "Vai, chama o teu marido e volta aqui." A mulher, espantada, respondeu: "Não tenho marido." Jesus lhe disse: "Falaste a verdade. De fato, não tens marido, porque já tiveste cinco maridos, e o homem com quem estás agora não é teu marido; nisso falaste com sinceridade."

Apesar de a samaritana ter tido relacionamentos conjugais por seis vezes, ainda estava sedenta de amor, cheia de carências e em busca de plenitude. Ela procurava o amor e a realização no outro, e, por isso, já estava no sexto relacionamento sem se sentir amada. O amor é uma fonte que jorra na alma de quem ama. A necessidade de ser amado, querido e protegido é uma dependência psicológica que resulta da imaturidade. Quanto mais maduro o indivíduo, mais independente se torna.

O convite de Jesus aponta para a busca da plenitude sem depender de outros seres, pois, por mais que nos amem, eles não podem nos dar o autoamor, que é a verdadeira fonte da água viva.

Ao dizer a ela: "De fato, não tens marido, porque tiveste cinco maridos, e o homem que agora está contigo também não é teu marido; isto disseste com verdade", Jesus procurava levá-la a entrar em contato com a verdade dentro de si, reconhecendo o padrão de superficialidade em que vivia.

Caindo em si, a samaritana despertou: "Senhor, vejo que és um profeta." A partir desse momento, ela percebeu a superioridade de Jesus e aprofundou a conversa, questionando-O sobre o grande dilema que separava judeus e samaritanos: onde adorar a Deus? Os samaritanos adoravam a Deus no monte Garazin, enquanto os judeus o faziam no templo em Jerusalém.

Jesus respondeu que em nenhum lugar externo encontraríamos Deus para adorá-Lo, porque Deus é Espírito e deve ser adorado em Espírito e Verdade. Isso só seria possível quando o ser humano conseguisse libertar-se dos processos externos, superar a superficialidade e se dispusesse a evoluir na vertical da vida.

A mulher deixou seu cântaro e correu à cidade, chamando as pessoas para banquetear-se com Jesus.

A imagem do cântaro é, de fato, significativa. Como um recipiente para água, ele simboliza a busca pelo amor e pela satisfação nos outros, na materialidade e nas crenças religiosas. No entanto, ao deixar cair o cântaro, a samaritana se liberta de qualquer dependência material, afetiva ou religiosa. Ela compreende que a felicidade e a plenitude podem ser alcançadas dentro de si mesma, por meio da transformação interior. Ela se torna a própria fonte de amor e autoestima. Ao amar a si mesma, ela se torna capaz de compartilhar esse amor com os outros e convida outras pessoas a buscar sua identidade com Jesus.