sábado, 29 de dezembro de 2018

A Transição Planetária

A Transição Planetária: Uma Análise Espírita da Renovação da Terra

A Transição Planetária: Uma Análise Espírita da Renovação da Terra

Vivemos atualmente os primeiros dias do terceiro milênio no nosso planeta, assim como o fenômeno da grande transição, conforme enunciado por Jesus no discurso escatológico, registrado pelos evangelistas Marcos, Mateus e Lucas.

A transição planetária sugere que o planeta está deixando para trás milênios de provas e expiações, ingressando lentamente em uma nova era, em conformidade com a lei do progresso. Isso porque nada e ninguém escapa às leis divinas.

O fenômeno transcorre marcado pelas características das duas etapas, onde os elementos de uma fase se misturam com os da outra. É por essa razão que o mundo vivencia extremos: presenciamos perversidades e crueldades sem precedentes, mas, simultaneamente, testemunhamos expressões de amor e fraternidade em uma intensidade nunca vista.

A Lei da Transição na Natureza

Ao observarmos a natureza, a lei da transição se torna evidente em todos os seus fenômenos. O dia não cede espaço à noite sem a transição do crepúsculo. Da mesma forma, as estações do ano, o ciclo lunar e as fases da vida humana, do nascimento à velhice, são marcados por nítidos períodos de mudança.

Sendo Deus o autor de todo o universo, todos os planetas estão também submetidos à lei do progresso. Assim, entre um ciclo planetário e outro, existe um período de transição, como o que atualmente vivenciamos na Terra.

A Visão Espírita da Transição

A Terra esteve material e moralmente num estado inferior ao em que hoje se acha, e atingirá, sob esse duplo aspecto, um grau mais elevado. Ela chegou a um dos seus períodos de transformação, em que, de mundo expiatório, tornar-se-á mundo regenerador. Os homens, então, serão felizes na Terra, porque nela reinará a lei de Deus.

Allan Kardec, no livro Gênese, cap. 18, item 08, reproduz o relato do espírito Arago:

"Quando se vos diz que a Humanidade chegou a um período de transformação e que a Terra tem que se elevar na hierarquia dos mundos, nada de místico vejais nessas palavras; vede, ao contrário, a execução da uma das grandes leis fatais do Universo, contra as quais se quebra toda a má vontade humana".

Os Evangelhos e a Transição

Os Evangelhos de Marcos 13, Mateus 24 e Lucas 21 registram o discurso escatológico de Jesus. Nesses textos, os discípulos perguntam ao Mestre sobre como identificar os sinais do fim do mundo. Jesus, então, esclarece-lhes, apontando os sinais dos tempos.

É importante destacar que as expressões bíblicas "fim do mundo", "consumação dos séculos" e "fins dos tempos" não indicam um final do mundo no sentido de uma destruição definitiva. Isso porque não existe um "fim" per se, mas um eterno ciclo de recomeços. O término de um ciclo ou de uma fase é simultâneo ao início do próximo. Caso contrário, não faria sentido Jesus prometer, em seu discurso sobre as bem-aventuranças, que os mansos herdarão a Terra. A promessa de que os mansos herdarão a Terra sugere que o planeta não será destruído.

A Terra não será destruída; ao contrário, será renovada. Essa ideia é refletida em muitas das parábolas de Jesus, incluindo a parábola da rede, a do festim de noivas, a do joio e do trigo, e a dos trabalhadores da última hora, dentre outras.

A Renovação da Terra

A Terra renovada servirá como refúgio para espíritos que buscam sua própria renovação moral. Enquanto isso, aqueles que ainda não se sintonizaram com essa nova realidade serão transferidos para outro planeta.

É exatamente isto que Jesus ensina na parábola da rede, que diz o seguinte:

O reino dos céus é semelhante a uma rede lançada ao mar, e que apanha toda a qualidade de peixes. E, estando cheia, a puxam para a praia; e, assentando-se, apanham para os cestos os bons; os ruins, porém, lançam fora. Assim será na consumação dos séculos: virão os anjos, e separarão os maus de entre os justos, e lançá-los-ão na fornalha de fogo; ali haverá pranto e ranger de dentes.

Interpretação da Parábola da Rede

Na parábola, alguns pontos se destacam para reflexão. O primeiro é a aferição de valores que ocorrerá no final dos tempos. Isso fica evidente quando a rede é lançada ao mar, recolhendo peixes de todas as espécies e quantidades, para somente depois proceder à sua separação. Essa mesma lógica é vista na parábola do joio e do trigo, onde ambos crescem juntos, sendo separados apenas posteriormente.

A Terra pode ser comparada a uma rede lançada ao mar, que reuniu uma vasta quantidade de espíritos. Atualmente, somos pouco mais que 7 bilhões, todos aqui para trabalhar pelo nosso próprio aperfeiçoamento moral dentro de um prazo estabelecido por Deus. Esse momento chegou; é o tempo de avaliação de valores e de separação.

A Aferição de Valores

O segundo ponto de destaque na parábola refere-se à separação entre os espíritos ruins dos justos. Esta diferenciação ocorre entre aqueles comprometidos com sua própria transformação moral e os que persistem no mal. Esta tarefa de separação é realizada por anjos, ou seja, espíritos puros que detêm as rédeas diretoras do planeta Terra.

Isto porque, entre as principais características da transição planetária, destaca-se a aferição de valores morais dos habitantes da Terra. Neste processo, os Espíritos verdadeiramente comprometidos com sua evolução moral herdarão o planeta renovado. Por outro lado, aqueles que conscientemente escolhem persistir no erro e no mal serão naturalmente conduzidos a reencarnar em outro mundo, onde conviverão com Espíritos de similar padrão evolutivo. É importante compreender que este exílio não constitui uma punição, mas representa uma manifestação do amor infinito e da misericórdia do Pai, que proporciona a cada filho as condições mais adequadas para seu progresso espiritual.

Emmanuel, no livro a Caminho da Luz, esclarece que "na direção de todos os fenômenos, do nosso sistema, existe uma comunidade de Espíritos puros e eleitos pelo Senhor Supremo do Universo, em cujas mãos se conservam as rédeas diretoras da vida de todas as coletividades planetárias".

O Exílio Espiritual

Emmanuel também afirma que, no distante passado, essa comunidade de espíritos puros se reuniu com o propósito de trazer à Terra os espíritos exilados do sistema Capela. Essa decisão ocorreu quando um dos orbes daquele sistema planetário estava passando por uma transição.

As grandes comunidades espirituais, que dirigem o cosmos, decidiram, então, enviar aquelas entidades, persistentes no crime, para esta Terra distante. Aqui, através da dor e dos laboriosos desafios do ambiente, elas aprenderiam as nobres conquistas do coração, impulsionando, ao mesmo tempo, o avanço dos seus irmãos mais atrasados.

O Simbolismo do Fogo e da Renovação

O terceiro ponto que se destaca na parábola é a menção às expressões "fogo e ranger de dentes". Elas são simbólicas, proferidas numa era em que a mentalidade limitada das pessoas não conseguia compreender o significado cósmico embutido nelas.

Quando Jesus afirma que os anjos separarão os maus dos justos e os lançarão na fornalha de fogo, onde haverá pranto e ranger de dentes, Ele está se referindo simbolicamente ao destino dos espíritos persistentes no mal. Esses espíritos reencarnarão em um mundo habitado por muitos outros semelhantes a eles, todos teimosos em suas inclinações negativas. Em mundos de provas e expiações, assim como em mundos primitivos, o mal prevalece.

Naturalmente, em um planeta onde o mal predomina, o sofrimento e a dor são inevitáveis, tal como descrito por Jesus com as palavras "choro e ranger de dentes". A "fornalha de fogo" pode ser entendida como a consciência da culpa. Todo indivíduo que pratica atos de maldade e perversidade, mais cedo ou mais tarde, se vê consumido pelo remorso e pela culpa. E, mesmo que essa consciência cause dor e queime intensamente, ela também possui um poder purificador. Esse fogo interior, por um lado, causa sofrimento, mas por outro, conduz o ser a uma transformação, redirecionando o curso de sua vida rumo a Deus.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

A Parábola dos Vinhateiros Homicidas

A Parábola dos Vinhateiros Homicidas e a Missão do Brasil

A Parábola dos Vinhateiros Homicidas e a Missão do Brasil

A Parábola dos vinhateiros homicidas, registrada por Mateus, capítulo 21, v. 33 a 45, interpretada à luz da doutrina espírita, permite identificar o porquê da reencarnação no Brasil.

Espíritos milenares, egressos de centenas de outras civilizações, muitas das quais nem mais existem, foram reunidos em terras brasileiras para cumprir um compromisso anunciado na Parábola dos vinhateiros homicidas.

A parábola dos vinhateiros homicida fala diretamente aos corações dos brasileiros sobre compromisso que temos com Jesus.

A Parábola Segundo Mateus

Um homem, chefe de família, plantou uma vinha, circundou-a com uma cerca, cavou nela um lagar para pisar uvas e construiu uma torre de guarda. Em seguida, arrendou a vinha a agricultores e viajou para o estrangeiro. Quando se aproximou o tempo dos frutos, enviou seus servos aos agricultores para receber seus frutos. Os agricultores, porém, agarraram os servos, espancaram a um, mataram a outro e a outro apedrejaram. Novamente o dono da vinha enviou outros servos, em maior número que os primeiros. Mas eles os trataram do mesmo modo. Por fim, enviou-lhes o próprio filho, dizendo: respeitarão a meu filho. Mas os agricultores, vendo o filho, disseram entre si: Este é o herdeiro. Vamos matá-lo e tomemos posse de sua herança! Então, agarraram-no e lançaram-no fora da vinha e o mataram. Então, quando o senhor da vinha voltar, que fará com esses agricultores? Perguntou Jesus aos que o ouviam. Eles responderam. Dará triste fim a esses criminosos e arrendará a vinha a outros agricultores, que lhe entregarão os frutos no tempo certo. Então, Jesus lhes diz: "Vocês nunca leram nas Escrituras? 'A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isso vem do Senhor, e é admirável aos nossos olhos? Por isso vos digo que o Reino de Deus vos será tirado e será dado a uma nação que produza seus frutos.

Interpretação Espírita da Parábola

O espiritismo aponta Deus como o Senhor da Vinha. A vinha é o campo de trabalho que Deus nos arrendou, nos emprestou, para que a cultivemos, fazendo-a frutificar. Corresponde, ainda, ao nosso psiquismo, vasto campo de trabalho aguardando o serviço do lavrador.

A vinha, no plano físico, corresponde a todas as nossas possibilidades de trabalho no mundo, como família, emprego, nossas atividades sociais, enfim. No plano íntimo, a vinha corresponde aos nossos sentimentos, emoções, vontade.

Pela lei do progresso material devemos cultivar a vinha no plano físico, contribuindo pelo aprimoramento do mundo. Pela lei do progresso moral devemos cultivar a vinha no plano íntimo, trabalhando pelo nosso adiantamento moral.

Elementos Simbólicos da Parábola

O lagar de pisar uvas é o instrumento para trabalhar na vinha, extraindo dela os frutos que correspondem, sob o ponto de vista espiritual, ao Evangelho ensinado por Jesus. Somente pela vivência do Evangelho poderemos transformar o mundo. O Evangelho de Jesus e a revelação espírita são os instrumentos que Deus nos enviou para que possamos cultivar a vinha nos nossos corações, a fim de produzir os frutos que Deus espera colher.

A Parábola informa que a vinha estava cercada e havia nela uma torre de guarda. Estes elementos remetem a ideia de um Pai cuidadoso, que zela de toda sua criação.

Na interpretação simbólica da parábola, os agricultores, que eram locatários da vinha, representam a humanidade em sua jornada evolutiva. Os servos enviados pelo proprietário para colher os frutos simbolizam os profetas do Antigo Testamento, mensageiros divinos que, antes da vinda de Cristo, foram enviados por Deus para orientar a humanidade. Estes profetas, conforme narrado nas escrituras, foram perseguidos, apedrejados, espancados e mortos.

O filho do senhor da vinha, enviado por último, representa o próprio Jesus Cristo - a pedra angular rejeitada pelos construtores, que também teve um destino trágico nas mãos dos homens. Diante destes acontecimentos, Jesus apresenta uma pergunta crucial aos seus ouvintes: "O que vocês acham que o senhor da vinha fará com esses agricultores?" A resposta é significativa: "Dará triste fim a esses criminosos e arrendará a vinha a outros agricultores, que lhe entregarão os frutos no tempo certo."

A conclusão da parábola traz uma profecia quando Jesus anuncia que o Reino de Deus seria retirado daquela geração e concedido a uma nação que produzisse os frutos esperados. Segundo a revelação espírita, esta nação mencionada na parábola é o Brasil, escolhido para ser o solo onde os ensinamentos do Cristo frutificariam em sua plenitude.

A Missão Espiritual do Brasil: Da França ao Coração do Mundo

O início da doutrina espírita teve seu marco em Paris, França, através da codificação realizada por Allan Kardec. Porém, conforme revelado no livro "Obras Póstumas", no capítulo "Primeira notícia de uma nova encarnação", os próprios espíritos comunicaram a Kardec que a semente plantada na França não alcançaria imediatamente sua plenitude. De fato, Kardec desencarnou em março de 1869 sem presenciar a ampla disseminação de seus ensinamentos.

Foi somente quarenta e um anos após sua partida, em 2 de abril de 1910, que nasceu em Pedro Leopoldo, Minas Gerais, Francisco Cândido Xavier. Através de sua mediunidade extraordinária, que resultou em 504 obras psicografadas, o espiritismo finalmente encontrou terreno fértil para florescer e se espalhar pelo mundo, tendo o Brasil como centro irradiador.

A Parábola da Vinha e sua Significação Espiritual

A trajetória do espiritismo pode ser compreendida através da Parábola da Vinha, mencionada por Jesus. A vinha, que simboliza os ensinamentos espirituais, foi retirada de Jerusalém, temporariamente cultivada na França, para finalmente estabelecer suas raízes definitivas no Brasil. Assim como o Evangelho foi um legado divino confiado inicialmente ao povo hebreu, o espiritismo tornou-se um legado especialmente destinado ao povo brasileiro, para ser vivenciado e exemplificado.

Brasil: Coração do Mundo, Pátria do Evangelho

A missão espiritual do Brasil começou a ser revelada em 1938, através da obra "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", psicografada por Chico Xavier. No primeiro capítulo, um diálogo significativo entre Jesus e Helil, um de seus elevados assessores espirituais, revela o destino especial reservado ao Brasil:

"Para esta terra maravilhosa e bendita será transplantada a árvore do meu Evangelho de piedade e de amor", afirmou Jesus, complementando que "sob a luz misericordiosa das estrelas da cruz, ficará localizado o coração do mundo!"

A Proteção Divina e a Missão dos Brasileiros

Quando Helil expressou preocupação com possíveis interferências de nações ambiciosas, Jesus respondeu com convicção:

"A região do Cruzeiro, onde se realizará a epopeia do meu Evangelho, estará, antes de tudo, ligada eternamente ao meu coração."

Embora todas as nações recebam a proteção divina, o Brasil possui uma ligação especial com o coração de Jesus. Esta conexão única traz consigo uma responsabilidade igualmente especial: os espíritos que reencarnam em solo brasileiro têm a oportunidade de trabalhar em sua transformação moral sob a orientação do conhecimento espírita.

Nossa Responsabilidade Espiritual

Para nós que reencarnamos no Brasil, com débitos de múltiplas existências, esta é uma oportunidade singular de evolução. Sob a orientação do conhecimento espírita e o amparo direto do Cristo, temos a chance de cultivar em nossos corações os frutos espirituais que o Mestre espera de nós.

Esta missão representa não apenas um privilégio, mas também uma grande responsabilidade: a de transformar o Brasil no verdadeiro Coração do Mundo e Pátria do Evangelho, conforme o planejamento divino.

Trabalhadores da última hora, mãos à obra! Possamos nos esforçar incansavelmente para transmudar sentimentos e emoções e, assim, permanecer caminhando com o Mestre amado, sob Sua inspiração direta.

No entanto, se abandoarmos o compromisso assumido, com certeza a vinha nos será tirada e dada a quem produza os frutos no tempo certo.

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

O Rico e Lázaro

A Parábola do Rico e Lázaro

A Parábola do Rico e Lázaro

A parábola do rico e Lázaro, registrada no Evangelho de Lucas, capítulo 16, versos 19 a 31, ressalta a possibilidade da comunicação entre os mortos e os vivos, as diferenças vibratórias entre os espíritos e a lei de causa e efeito. O cerne dessa parábola, entretanto, é a indiferença moral, que se revela como uma característica predominante nos habitantes do planeta Terra, dificultando o seu progresso em direção a Deus.

A Indiferença como Cristalização do Sentimento

Emmanuel, no livro "O Consolador", na questão 180, afirma que a indiferença é a cristalização do sentimento. O benfeitor ressalta que a indiferença é um dos piores estados psíquicos da alma, uma vez que anula as possibilidades de progresso do espírito, bloqueando os germes de sua perfeição.

Reflexões no Evangelho Segundo o Espiritismo

No capítulo IX, item 8, do "Evangelho Segundo o Espiritismo", o espírito comunicante, coincidentemente chamado Lázaro, registra que a civilização planetária atualmente apresenta a atividade intelectual como virtude, enquanto mantém a indiferença moral como vício.

Progresso Intelectual e Indiferença Moral

A humanidade, sem dúvida, tem progredido de maneira admirável no campo do conhecimento, na pesquisa científica e na tecnologia. Entretanto, juntamente com essas conquistas tecnológicas surpreendentes, a indiferença moral em relação às necessidades dos outros também é impressionante.

A indiferença moral pode ser observada nas ruas tanto dos pequenos quanto dos grandes centros urbanos, acompanhando em silêncio a ativa atividade intelectual humana. Entre prédios, veículos, construções e equipamentos públicos, permanecem invisíveis os necessitados que estão presentes por toda parte: nos semáforos, nas calçadas, nas portas de bancos, lojas e restaurantes, estendendo suas mãos em busca de ajuda, enquanto aqueles que passam por eles seguem indiferentes.

A indiferença moral também se manifesta nos comportamentos humanos que optam por não cumprimentar um conhecido, agindo como se não o vissem. Ela está presente nos comportamentos que negam a um pai, irmão, filho, amigo ou até a um desconhecido qualquer forma de auxílio, seja material ou intelectual.

A Parábola Contada por Jesus

Foi por isso que Jesus contou esta parábola:

“Havia um homem rico que se vestia de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente. Havia também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele. E desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas. E aconteceu que o mendigo morreu e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; e morreu também o rico e foi sepultado.

No Hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão e Lázaro, no seu seio. E, clamando, disse: Abraão, meu pai, tem misericórdia de mim e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro, somente males; e, agora, este é consolado, e tu, atormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá.

E disse ele: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos, para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos. E disse ele: Não, Abraão, meu pai; mas, se algum dos mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam. Porém Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite.”

Parábolas de Jesus: Convites à Reflexão e Transformação Moral

As parábolas de Jesus são convites à reflexão, orientados para o processo de transformação moral. Diante deste texto, é relevante questionarmo-nos se nos identificamos com algum dos personagens ou com os conteúdos e símbolos apresentados.

O personagem rico na parábola representa a indiferença diante das necessidades alheias. Apesar de ser retratado como alguém rico em recursos materiais, é crucial considerar todas as demais riquezas que Deus concede ao espírito para sua jornada evolutiva bem-sucedida. Todas as pessoas possuem talentos e possibilidades diversificadas, muitas vezes não compartilhadas com os outros devido à indiferença e ao egoísmo que as aprisionam.

Por outro lado, os "Lázaros" das necessidades podem ser qualquer pessoa em dificuldade ou necessidade, buscando auxílio dos outros, mas encontrando apenas indiferença e frieza por parte daqueles a quem pedem ajuda. São indivíduos que Deus espera serem socorridos por meio do auxílio de outros, mas que não encontram nos corações daqueles que possuem a capacidade de ajudar a boa vontade necessária para se tornarem instrumentos de apoio aos necessitados.

O Desafio da Transformação Interior

O grande desafio apresentado pela parábola é a capacidade de reconhecer, no íntimo de cada ser, a presença da indiferença, buscando dissolvê-la. Essa ação permitirá libertar-se das correntes do egoísmo, um vício de caráter que colocou o rico da parábola em um estado doloroso de consciência, que se assemelha ao inferno. Este é o destino de todos aqueles que conduzem suas vidas na direção oposta à lei do Amor

O Despertar do Rico no Mundo Espiritual

O rico, da parábola, desperta no mundo espiritual em uma situação dolorosa, resultado direto do egoísmo que guiou o uso dos talentos que Deus lhe concedeu. Ele percebe que Lázaro está em uma condição melhor do que a sua e é informado de que isso ocorre porque Lázaro enfrentou as provações de sua vida miserável com resignação. Em meio à profunda amargura, ele suplica por ajuda a Abraão, que na parábola representa um benfeitor espiritual.

Os Desígnios Divinos e o Abismo Entre as Almas

Contudo, Abraão não pode socorrê-lo naquele momento, sendo-lhe impossível. Um abismo existe entre aqueles que se atormentam com a culpa em suas consciências e aqueles que aprenderam a amar e a servir.

Deus cuida de todos os Seus filhos, atendendo às suas necessidades verdadeiras, não aos seus desejos superficiais. No caso do rico, sua impossibilidade de receber socorro naquele momento decorre dos desígnios da lógica divina, que muitas vezes são desconhecidos e inacessíveis aos seres humanos. Em algumas ocasiões, a maior dor e o mais intenso sofrimento na vida de uma pessoa podem ser os instrumentos que a conduzirão a uma conexão mais profunda com Deus.

O apóstolo Paulo, na segunda carta aos Coríntios, capítulo 12, versos 7 e 8, faz referência a um "espinho na carne" que o atormentava constantemente. Ele havia suplicado a Deus para ser libertado desse sofrimento. Contudo, a resposta divina foi negar seu pedido, pois esse "espinho" era aquilo que o mantinha espiritualmente vigilante e atento.

Isso ilustra que nem sempre a remoção imediata do sofrimento é o melhor caminho, pois às vezes é através dessas dificuldades que somos impulsionados a crescer espiritualmente e a desenvolver uma maior proximidade com Deus.

A Dor Como Ferramenta de Renovação

Léon Denis, no livro "O Problema do Ser, do Destino e da Dor", destaca a importância da dor no processo de renovação moral. Ele descreve a dor como uma ferramenta divina capaz de purificar o coração humano, eliminando o mal que a consciência não reconheceu.

O egoísmo do rico na parábola se manifesta mesmo quando ele está enfrentando o sofrimento. Ele está disposto a rogar por bênçãos divinas somente para seus entes queridos, demonstrando esquecimento em relação às demais criaturas humanas, que também são filhas do mesmo Pai. Ele pede a Lázaro, em espírito, que retorne para alertar seus irmãos sobre as verdades da vida após a morte. No entanto, sua preocupação está apenas com sua família, ignorando as necessidades de todas as outras criaturas. O egoísmo ainda prevalece em seus impulsos, e ele não percebe que é exatamente esse egoísmo que é a raiz de toda a dor e sofrimento que está vivenciando.

Os Ensinamentos de Moisés e os Profetas

Abraão respondeu, afirmando que os familiares do rico já tinham à disposição Moisés e os Profetas, e que eles deveriam estudar esses ensinamentos, pois nada do que estava ocorrendo era novo; todas essas verdades já haviam sido transmitidas pelos missionários que vieram antes de Jesus.

O rico possuía as revelações divinas deixadas pelos Profetas, mas negligenciou a oportunidade de se aprofundar nessas sábias palavras e permitir que elas guiassem sua vida.

O Evangelho de Jesus e a Doutrina Espírita

A humanidade tem no Evangelho de Jesus um guia para a sua evolução espiritual, e na Doutrina Espírita um manual para percorrer esse caminho. Conhecer, refletir e aplicar os ensinamentos que Jesus nos deixou é uma escolha individual que compete a cada um fazer.

terça-feira, 3 de julho de 2018

Os Trabalhadores da Vinha

A Parábola dos Trabalhadores da Vinha

A Parábola dos Trabalhadores da Vinha

Pois o Reino dos Céus é semelhante ao homem, pai de família, que saiu de ao raiar do dia a assalariar trabalhadores para a sua vinha. Depois de ajustar com os trabalhadores um denário por dia, os enviou para sua vinha. E tendo saído por volta da terceira hora, viu outros, que estavam de pé na praça, desocupados, e disse a esses: Ide vos também para a vinha, e o que for justo vos darei. E, eles foram. Novamente, saindo por volta da sexta e nona hora, procedeu da mesma forma. Tendo saído por volta da undécima hora, encontrou outros, que estavam de pé, e diz para eles: por que ficastes de pé, aqui, o dia inteiro, desocupados? Eles lhe dizem: Porque ninguém nos assalariou. Ele lhe diz: Ide vos também para a vinha. Chegado ao fim da tarde, o senhor da vinha diz ao seu administrador: Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, começando dos últimos até os primeiros. Vindo os da undécima hora, receberam um denário, cada um. Vindo os primeiros, pensaram que receberiam mais; todavia, também eles receberam um denário, cada um. Ao receberem, murmuraram contra o senhor da casa, dizendo: Estes últimos fizeram só uma hora, e tu os fizestes iguais a nós, que carregamos o peso do dia e o calor ardente. Em resposta, disse a um deles: Companheiro, não estou sendo injusto contigo. Não ajustaste comigo um denário? Toma o teu e vai-te; quero dar a este último tanto quanto a ti. Não me é lícito fazer o que quero com o que é meu? Ou o teu olho é mau, por que eu sou bom? Assim, os últimos serão primeiros, e os primeiros serões últimos. Mateus 20:1-16.

O Significado Espiritual do Trabalho e da Vinha

Nas parábolas de Jesus, o Reino dos Céus frequentemente é equiparado a um estado íntimo de consciência. Esta condição de plenitude espiritual, no contexto da parábola, se assemelha ao trabalho: enquanto no plano material ele impulsiona o progresso do mundo, no âmbito interno, catalisa o desenvolvimento espiritual. A vinha, ao representar o âmbito de atuação do espírito imortal, simboliza tanto o mundo tangível quanto o universo íntimo de cada ser.

Em todos os planos da vida, Deus nos convida ao trabalho. No mundo, somos encorajados a contribuir para o progresso material; internamente, somos convocados a laborar no terreno de nossos corações, cultivando virtudes que nos elevam a níveis superiores.

Na parábola, o trabalho assume um matiz espiritual, refletindo como Jesus fala aos nossos corações. O Pai de família, que busca trabalhadores em diferentes momentos do dia, ilustra que Deus, incessantemente, convoca seus filhos ao árduo trabalho de transformação moral.

A Transição Planetária e o Momento Atual

No entanto, há aqueles que acolhem o chamado divino mais cedo, enquanto outros o fazem mais tarde. Porém, todos, inevitavelmente, despertarão. E a recompensa para todos os trabalhadores será a mesma, independentemente de quando começaram sua jornada de regeneração.

O versículo 08 destaca o momento do pagamento aos trabalhadores: a noite. Como a noite simboliza o término do dia, a parábola sugere o final de um ciclo ou etapa evolutiva.

No capítulo 20 do 'Evangelho Segundo o Espiritismo' (ESE), a parábola é analisada por quatro espíritos, incluindo o Espírito da Verdade. Eles afirmam que ela antecipa momentos decisivos que a humanidade enfrentará, visto que está nos planos divinos a transição da Terra para a categoria de mundo de regeneração. Isso significará que nosso planeta deixará de ser um refúgio para espíritos que precisam de um mundo de provas e expiações para evoluírem.

O Trabalho de Transformação Moral

Os espíritos destacam que novos tempos se aproximam para a humanidade. Estamos, assim, nas últimas horas de um ciclo, aguardando o alvorecer de uma nova era, e é por isso que Jesus enfatiza tanto a importância do trabalho de transformação moral.

No "Evangelho Segundo o Espiritismo" (ESE), na página 221, ao discorrer sobre esta parábola, o espírito Erasto exorta: "Arme-se de decisão e coragem, ó vossa legião! Mãos à obra! O arado está pronto; a terra, preparada: Arai."

A 'terra preparada', moldada pelas lutas e experiências de inúmeras encarnações passadas, simboliza o coração. O 'arado', por sua vez, representa a vontade. Portanto, com a vontade determinada, podemos trabalhar nosso interior, removendo imperfeições que obstruem o desenvolvimento de virtudes. Estas virtudes nos preparam para herdar a Terra.

A Inveja como Obstáculo Espiritual

Na parábola, Jesus sinaliza a iminência dos tempos delineados por Deus. A Terra está predestinada aos mansos e pacíficos, conforme proclamou no Sermão do Monte. Este é, de fato, o ponto ápice da parábola, ressaltando a imperativa necessidade de reflexão sobre esse ensinamento.

Os primeiros trabalhadores, apesar de sua prolongada dedicação na vinha, ainda não haviam cultivado a mansidão e a paz interior. Embora tenham atendido ao chamado do Senhor da Vinha e se dedicado por mais tempo, não estavam aptos a herdar a terra.

O tratamento igualitário dispensado pelo Senhor da Vinha aos trabalhadores que chegaram posteriormente causou inconformismo nos que haviam chegado mais cedo, levando-os a questionar o Senhor. Esse ato revelou um coração tomado pela inveja. Assim, a resposta veio: 'Companheiro, não estou sendo injusto contigo. Não ajustaste comigo um denário? Toma o que é teu e vai. Quero dar a este último tanto quanto a ti. Não posso fazer o que desejo com o que é meu? Teu olho é invejoso porque eu sou generoso?

A Natureza da Inveja e Suas Consequências

Um coração dominado por inveja e ciúme não vibra em sintonia com a mansidão. A parábola nos convida a refletir sobre esta imperfeição moral, que ainda marca presença em muitos de nós que habitam a Terra.

A inveja difere da cobiça. Enquanto a cobiça é o desejo de possuir o que pertence a outro — e, apesar de negativa, é um mal menor — a inveja é a perversa satisfação em ver ou causar a ruína da felicidade alheia, seja em conquistas morais ou materiais.

A inveja é uma profunda falha de caráter, um veneno que corrompe o coração. É uma enfermidade altamente nociva, pois é matriz de muitos males. Inclusive, foi essa falha que motivou o exílio de muitos espíritos para nosso planeta, incluindo os capelinos.

A Superação da Inveja e o Caminho para a Evolução

O canto de dor dos espíritos exilados de Capela, encontra-se representada nos primeiros capítulos da Bíblia. As imagens simbólicas de Adão e Eva, expulsos do paraíso, e de Caim, que mata Abel movido pela inveja, servem como advertências às futuras gerações: um aviso para não caírem nos mesmos padrões comportamentais que os distanciaram de Deus.

A inveja é um sentimento presente apenas nos corações dos espíritos menos evoluídos. Isso é evidenciado na resposta à questão 970 do 'Livro dos Espíritos'. Como a Terra está destinada a elevar-se na hierarquia dos mundos, cabe a nós aprimorar nosso padrão vibratório. Apenas assim estaremos aptos a continuar nossas reencarnações neste planeta.

À medida que nosso planeta avança rumo a uma nova Era, apenas os espíritos que se libertarem das amarras do mal continuarão a reencarnar aqui. A inveja, destacada na parábola, é uma raiz do mal, surgindo do orgulho, vaidade e egoísmo.

O Combate à Inveja e a Busca pela Evolução Espiritual

Na questão 933 do 'Livro dos Espíritos', é afirmado que a inveja e o ciúme são como torturas da alma; são como vermes que corroem e destroem psicologicamente quem os sente.

Dessa forma, a parábola funciona como um chamado de Jesus para superarmos a inveja dentro de nós, assumindo, com humildade, o reconhecimento de que ainda carregamos essa imperfeição em nossos corações.

Reconhecer a existência do mal, sua magnitude e esfera de influência, é essencial para compreendê-lo e, consequentemente, dominá-lo. Um guerreiro está preparado para combater apenas os inimigos que reconhece. Admitir a presença do mal em nosso coração é o primeiro passo rumo à sua superação.

O Papel da Fé e da Graça Divina

O subsequente e crucial passo para subjugar esse adversário interno é a conscientização de nossa dependência da graça divina. Ao orarmos a Deus, solicitando Sua ajuda para superar as mazelas da inveja e do ciúme, conectamo-nos às forças cósmicas que sustentam a harmonia do universo.

Joana de Angelis, no livro 'Em Busca da Verdade', aconselha-nos a cultivar sentimentos nobres com genuína alegria. Devemos encontrar satisfação na felicidade alheia, especialmente se almejamos seguir os ensinamentos de Jesus.

sábado, 19 de maio de 2018

As Dez Virgens:

A Parábola das Dez Virgens: Uma Análise Espiritual e Psicológica

A Parábola das Dez Virgens: Uma Análise Espiritual e Psicológica

A Parábola Original

O reino dos céus será semelhante a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram ao encontro do esposo. E cinco delas eram prudentes, e cinco insensatas. As insensatas, tomando as suas lâmpadas, não levaram azeite consigo. Mas as prudentes levaram azeite em suas vasilhas, com as suas lâmpadas. E, tardando o esposo, tosquenejaram todas, e adormeceram. Mas à meia-noite ouviu-se um clamor: Aí vem o esposo, saí-lhe ao encontro. Então todas aquelas virgens se levantaram, e prepararam as suas lâmpadas. E as loucas disseram às prudentes: Dai-nos do vosso azeite, porque as nossas lâmpadas se apagam. Mas as prudentes responderam, dizendo: Não seja caso que nos falte a nós e a vós, ide antes aos que o vendem, e comprai-o para vós. E, tendo elas ido comprá-lo, chegou o esposo, e as que estavam preparadas entraram com ele para as bodas, e fechou-se a porta. E depois chegaram também as outras virgens, dizendo: Senhor, Senhor, abre-nos. E ele, respondendo, disse: Em verdade vos digo que vos não conheço. Vigiai, pois, porque não sabeis nem o dia e nem a hora. Mateus 25, 1-13.

Interpretação e Contexto

Embora muitas interpretações desta parábola tenham um enfoque escatológico, as palavras de Jesus oferecem múltiplas perspectivas. É plenamente possível entendê-la não apenas como uma visão do fim dos tempos, mas também como um convite ao autoconhecimento.

Ao utilizar elementos de um casamento tradicional judeu como pano de fundo, Jesus destaca a ideia de uma união cósmica e de uma conexão profunda, como um pilar que sustentará todas as outras imagens e mensagens contidas no texto.

A parábola descreve o encontro de dez virgens com o noivo. Segundo a tradição judaica, durante a cerimônia de casamento, a noiva era acompanhada por suas amigas no trajeto até o noivo. Este, por sua vez, também caminhava em direção à casa da noiva, ladeado por seus amigos.

Simbolismo Espiritual

No entanto, na parábola, Jesus omite qualquer menção à noiva, focando apenas em suas amigas, as virgens. Isso se dá porque Jesus não alude a um casamento terreno, mas sim à união entre a humanidade — o Seu rebanho — e Ele mesmo, o divino pastor.

Simbolicamente, Jesus é retratado como o noivo da humanidade, conforme evidenciado em Mateus 9:14-17. Essa representação também é reforçada na resposta à questão 309 do livro "O Consolador", ditado pelo espírito Emmanuel e psicografado por Chico Xavier.

O Reino dos Céus

Um dos pontos centrais da parábola é a analogia do reino dos céus com as dez virgens que se dirigem ao encontro do noivo. Jesus frequentemente se referiu ao "reino dos céus", utilizando diversas metáforas e elementos cotidianos da vida do povo judeu para facilitar a compreensão. Em Lucas 17:20-21, o Mestre clarifica sua mensagem, declarando que o reino não se localiza externamente, mas reside no interior de cada indivíduo. Isso sublinha que o "reino dos céus" não é um lugar físico, mas sim um estado interno de harmonia, equilíbrio e regência pelo amor incondicional.

Observamos, também, que as virgens, ao serem comparadas ao reino dos céus, avançam em direção ao noivo. Isso sugere que esse estado interno de harmonia, equilíbrio e domínio pelo amor incondicional não é algo que se recebe passivamente, mas uma conquista que exige esforço ativo.

O Simbolismo do Número Dez

A escolha do número dez na parábola também é significativa. Na tradição judaica, os números carregam profundos significados simbólicos. O número dez, em particular, representa perfeição e totalidade. Assim, as dez virgens podem ser vistas como um símbolo da busca completa e perfeita pela harmonia interior e pelo amor incondicional.

Na parábola, as dez virgens não representam uma unidade perfeita e coesa, pois enquanto metade delas é descrita como prudente, a outra metade é caracterizada como imprudente. Assim, a imagem das dez virgens ilustra uma totalidade que, apesar de completa, possui suas metades em desequilíbrio.

Psicologia Profunda e Autoconhecimento

Esta analogia pode ser estendida à humanidade atualmente encarnada no planeta. Em um mundo de provas e expiações como o nosso, o psiquismo humano, devido aos seus inúmeros conflitos internos, apresenta-se fragmentado. Existe uma parte de nós que é consciente e conhecida, enquanto outra permanece oculta e misteriosa. Há uma faceta que age com prudência e discernimento, e outra que pode ser impulsiva e até assustadora. Da mesma forma, enquanto uma parte de nós consegue controlar e dominar nossas tendências, a outra pode estar repleta de imperfeições e vícios que, por vezes, sobrepõem-se à nossa razão. Esta dualidade reflete a contínua luta interna que muitos enfrentam em sua jornada espiritual e evolutiva.

Joana de Angelis, através da série psicológica psicografada por Divaldo Franco, faz alusão ao pensamento de Carl Jung para elucidar aspectos profundos da psique humana. Segundo essa perspectiva, a parte desconhecida da personalidade abriga conteúdos psíquicos que o EU (ou SELF, conforme a terminologia junguiana) não reconhece conscientemente. Estes conteúdos estão armazenados no que é chamado de inconsciente profundo.

Este repositório oculto do inconsciente frequentemente exerce uma influência poderosa sobre nossas ações e decisões, levando-nos a agir de maneiras surpreendentes que, por vezes, contradizem nossa própria compreensão consciente. É como se existisse uma força interior, raramente reconhecida, capaz de direcionar aspectos significativos de nossa existência.

Considerando a influência profunda e misteriosa do inconsciente sobre o comportamento humano, compreende-se por que o autoconhecimento tornou-se um tema central nas parábolas de Jesus. O Mestre enfatizou a importância do olhar interior, do reconhecimento e da integração de todas as dimensões do ser, como caminho para uma vida mais plena e alinhada com o amor e a verdade divinos.

O Sono Espiritual e o Despertar

Outro aspecto marcante da parábola é o sono que acomete todas as virgens. Mesmo estando equipadas com suas lamparinas, em determinado ponto da espera pelo noivo, todas adormecem devido à sua demora.

O sono, neste contexto, pode ser interpretado como uma metáfora para a inércia espiritual. Representa a estagnação e a inatividade do espírito, simbolizando a ausência do esforço contínuo e necessário para o autoconhecimento. Esse estado de "sono" reflete o comodismo, o desinteresse e o descaso na jornada de despertar da consciência. É uma postura passiva diante da vida e da evolução espiritual.

Essa inércia, simbolizada pelo sono, prende o ser humano ao estágio evolutivo em que se encontra, atuando como uma espécie de anestesia para a vontade e o ímpeto de crescimento. Em vez de avançar e buscar a iluminação e o entendimento, a alma permanece adormecida, perdendo oportunidades valiosas de evolução e aprendizado.

O Despertar da Consciência

O momento em que as virgens são despertadas pela chegada inesperada do noivo é, sem dúvida, o clímax da parábola. Jesus, em sua maestria, utiliza simbolismos profundos e transcendentais para transmitir seus ensinamentos. A chegada do noivo à meia-noite não é um detalhe trivial. A meia-noite, marcada pelo encontro dos ponteiros do relógio, simboliza o fim de um ciclo e o início de outro.

Dentro desse contexto, a chegada do noivo nesse momento específico sugere que o despertar espiritual pode ocorrer justamente quando menos esperamos, no limiar entre duas fases de nossa existência. É um lembrete de que a oportunidade para a transformação e o crescimento espiritual pode surgir a qualquer momento, e que devemos estar sempre preparados e vigilantes para recebê-la.

Nas cartas de Paulo aos Romanos, capítulo 13, versos 11-12, destaca-se a advertência do apóstolo do Cristo: "Reconheceis o momento em que viveis, já é hora de despertar do sono. A noite está avançada, o dia se aproxima. Rejeitemos, pois, as obras das trevas, e vistamo-nos das armas da luz."

A parábola aponta para o despertar da consciência, pois a humanidade já se encontra em condições de realizá-lo. Ao despertarem, as virgens percebem que não podem mais seguir juntas, pois durante o sono suas lâmpadas se apagaram e metade delas não tinha azeite suficiente para mantê-las acesas.

O Confronto com as Máscaras Psicológicas

As virgens insensatas representam as máscaras que criamos para sustentar nossas pseudovirtudes. Quando o ser humano não busca o autoconhecimento, quando se recusa a aceitar-se, quando não se perdoa, alimenta para si falsas virtudes, numa tentativa ilusória de compensar-se, acreditando ser o que não é.

Todo movimento ilusório, do ponto de vista psicológico, um dia perde o combustível e não consegue sustentar-se, levando o ser a experimentar, muitas vezes, um despertar doloroso, como aconteceu com as virgens que, só então, perceberam o quanto se equivocaram.

Surge, novamente, a necessidade de se autodescobrir, para o trabalho de transformação moral, abandonando as máscaras e todos os outros artifícios psicológicos que evitam o despertar da consciência, rumo à plenitude espiritual.

Por fim, considere-se que a separação das virgens retrata a divisão de um todo. No caso da parábola, metade luz, metade trevas. Neste aspecto, já advertira o Cristo: "Todo reino dividido contra si mesmo será destruído. Toda cidade, toda casa dividida contra si mesma não pode subsistir". Mateus 12:25.

Conclusão

Jesus termina a parábola recomendando orai e vigiai porque não sabemos o dia e a hora.

Aproveitar a encarnação para o exercício do autoconhecimento é missão de todos aqueles que buscam os patamares superiores da vida. O relógio da imortalidade já marcou meia noite. É chegada a hora!

domingo, 22 de abril de 2018

O Grande Banquete

A Parábola do Grande Banquete - Uma Análise Espiritual Profunda

A Parábola do Grande Banquete: Uma Análise Espiritual

Um certo homem preparou um grande banquete e convidou a muitos. Na hora do banquete, enviou seu servo avisar os convidados: Vinde, já está preparado. E todos, um após um, foram se desculpando. O primeiro disse: Comprei um terreno e preciso examiná-lo; por favor, aceite minhas desculpas. O segundo disse, comprei cinco juntas de bois e vou prová-los por favor, aceite minhas desculpas. O terceiro disse: acabo de casar e não posso ir. O Servo voltou para informar o senhor. Então o senhor da casa, irritado, disse ao seu servo: Sai depressa pelas ruas e vielas da cidade e trazei para cá os pobres, mutilados, cegos e coxos. O servo lhe disse: Senhor, foi feito como ordenastes, e ainda sobra lugar. O senhor disse ao servo: Sai pelos caminhos e atalhos e obriga-os a entrar, para que a minha casa se encha. Lucas 14:16-24.

A Essência da Parábola

Esta parábola nos apresenta uma profunda ilustração da realidade do espírito imortal em sua jornada evolutiva. Em sua estrutura, encontramos elementos que revelam como o amor divino se manifesta de diferentes formas para alcançar todos os seus filhos. O homem que organiza o banquete simboliza Deus, e o servo único representa a manifestação constante da vontade divina, que se adapta às diferentes circunstâncias mas mantém seu propósito fundamental: trazer todos ao banquete da comunhão com o Criador.

Todos os seres criados por Deus têm como destino a perfeição. É uma fatalidade da qual ninguém pode escapar. O ser humano pode estacionar temporariamente em sua jornada, mas não pode evitar o progresso, pois Deus exerce sobre todos os seus filhos uma força magnética à qual, cedo ou tarde, ninguém consegue resistir. O caminho em direção a Deus é inevitável, embora possa se manifestar através de diferentes experiências.

O Significado do Banquete

Na cultura judaica, um banquete representava muito mais que uma simples refeição. Era uma ocasião de profunda significação espiritual e social, reservada para estabelecer vínculos importantes e comunhão íntima. Ao utilizar esta metáfora, Jesus ilustra o desejo de Deus de estabelecer uma relação próxima com todas as suas criaturas.

Esta comunhão plena só será alcançada quando o espírito atingir a perfeição necessária, conforme esclarecido na questão 11 do Livro dos Espíritos:

"Será dado um dia ao homem compreender o mistério da Divindade?"

"Quando não mais tiver o espírito obscurecido pela matéria. Quando, pela sua perfeição, se houver aproximado de Deus, ele o verá e compreenderá."

O Servo e as Três Missões

Na parábola, vemos um único servo que recebe três missões diferentes. Esta estrutura é fundamental para compreendermos como a vontade divina se manifesta de formas diferentes, adaptando-se às circunstâncias e à receptividade dos espíritos, mas mantendo sempre sua essência amorosa.

Primeira Missão: O Chamado pelo Amor

O servo primeiramente é enviado para avisar aos convidados que o banquete está pronto. Os dois verbos iniciais, "convidar" e "avisar", simbolizam os chamados e os alertas do amor. Este momento representa o chamado inicial de Deus, que oferece a todos a oportunidade de evolução por meio do amor. As recusas dos convidados ilustram como frequentemente as pessoas priorizam questões materiais em detrimento do crescimento espiritual.

As Três Áreas de Provação

É importante compreender que as experiências fundamentais dos espíritos em mundos de provas e expiações, como a Terra, manifestam-se principalmente através de três esferas essenciais da vida: o trabalho, as relações afetivas e a gestão do patrimônio. Estas não são meras áreas de atividade humana, mas representam campos de aprendizado onde os princípios divinos podem ser exercitados e compreendidos em profundidade.

No campo do trabalho, o espírito aprende sobre cooperação, responsabilidade, criatividade e serviço ao próximo. Através das relações afetivas, desenvolve o amor incondicional, a compaixão, o perdão e a superação do egoísmo. Na gestão do patrimônio, exercita o desapego, a generosidade, a justiça e a administração sábia dos recursos que lhe são confiados.

Estas três esferas não são escolhidas arbitrariamente, mas constituem os campos naturais onde o espírito pode desenvolver virtudes essenciais ou, quando mal orientado, desviar-se temporariamente de seu caminho evolutivo. São como salas de aula onde cada experiência, seja ela considerada positiva ou negativa, oferece oportunidades de aprendizado e crescimento espiritual.

É por meio destas vivências cotidianas que o espírito tem a oportunidade de transformar conhecimento em sabedoria, teoria em prática, e compreensão intelectual em vivência moral. Cada situação apresenta escolhas que podem aproximá-lo ou afastá-lo temporariamente de seu objetivo evolutivo, embora o progresso final seja inevitável.

Segunda Missão: O Chamado pela Expiação

Após as recusas iniciais, o mesmo servo é enviado às ruas e vielas para trazer os pobres, mutilados, cegos e coxos.

Ao desperdiçar oportunidades de evolução através do exercício de virtudes e da aquisição de conhecimentos nas experiências vividas no âmbito do trabalho, patrimônio e relações afetivas, o indivíduo acumula sérios débitos para consigo mesmo. Assim, mais tarde, ele é conduzido, e não apenas convidado, a evoluir por meio de experiências expiatórias.

O segundo servo simboliza a expiação. Por essa razão, Jesus emprega o verbo 'trazer' (ou 'buscar', dependendo da tradução do texto) ao se referir a ele. Esse uso verbal destaca uma certa imposição. Daí a menção aos pobres, cegos, coxos e mutilados. Estes não representam deficiências físicas, mas sim espirituais. Em expiação, encontram-se aqueles que são pobres em amor ao próximo, cegos de espírito, mutilados de coração e coxos em seus sentimentos, todos por não terem aproveitado adequadamente as oportunidades de caminharem em direção a Deus por meio do amor.

A Resposta à Expiação: Resignação ou Revolta

As experiências agora são difíceis porque o orgulho cegou a alma, a vaidade mutilou os sentimentos e o egoísmo impediu o amor de expressar-se fraternalmente como Jesus ensinou.

As experiências expiatórias despertam na alma humana dois sentimentos distintos: resignação e revolta.

A resignação conduz o espírito de volta ao caminho do amor, pois reconhece que os desafios presentes são reflexos de erros passados. Essa aceitação diante das adversidades é a manifestação da compreensão profunda das palavras de Cristo: "Bem-aventurados os que choram, pois serão consolados.

Já a revolta tem um efeito paralisante sobre o espírito, fazendo-o estagnar em sua jornada. Esse estado perdura até que, eventualmente, o espírito seja compelido a prosseguir em sua caminhada evolutiva.

Terceira Missão: O Chamado pela dor

Na última missão, o servo é enviado aos caminhos e atalhos para compelir todos a entrarem. Esta fase representa a universalidade do amor divino, que não desiste de nenhum de seus filhos e utiliza diferentes meios para alcançá-los.

O emprego do verbo 'forçar' por Jesus não foi aleatória. Ele quis enfatizar que todas as criaturas, inevitavelmente, alcançarão a perfeição, seja pelo caminho do amor ou pelo da dor.

Quando as oportunidades de evolução pelo amor são negligenciadas, o ser é impelido a crescer através de experiências expiatórias. Estas, gradualmente e por meio da resignação,reconduzirão ao caminho do amor.

Contudo, se, diante da expiação, a alma opta por nutrir uma revolta silenciosa contra todos e contra Deus, resistindo ao crescimento espiritual, ela será compelida a avançar sob o peso da dor e do sofrimento, em múltiplas vivências, até que reencontre o caminho do amor.

Por isso, na parábola, a última missão do servo foi consuzir,por meio do sofrimento, todas as almas revoltadas, rebeldes e persistentes no erro a marcharem rumo a Deus.

A Manifestação do Amor Divino

A progressão das missões do servo demonstra como o amor divino se adapta às diferentes necessidades e resistências dos espíritos. Não há uma divisão entre amor e expiação, mas sim diferentes manifestações do mesmo amor divino, que busca alcançar cada espírito da maneira mais adequada ao seu estado evolutivo.

Quando as oportunidades iniciais não são aproveitadas, novas circunstâncias são criadas, não como punição, mas como novas expressões do amor divino, buscando despertar a consciência espiritual através de diferentes experiências e desafios.

O Caminho Inevitável

A progressão das missões do servo ilustra uma verdade fundamental: todos os espíritos, em algum momento, responderão ao chamado divino. A escolha do verbo "compelir" na última missão não sugere uma imposição punitiva, mas sim a inevitabilidade do progresso espiritual.

Esta compreensão nos permite perceber que todas as experiências, sejam elas aparentemente fáceis ou difíceis, são manifestações do mesmo amor divino, adaptando-se às necessidades evolutivas de cada espírito. O objetivo final permanece constante: conduzir todos os espíritos ao banquete divino, à comunhão plena com o Criador.

sábado, 31 de março de 2018

A Páscoa

O Significado Espiritual da Páscoa

O Significado Espiritual da Páscoa

A celebração da Páscoa carrega consigo um profundo significado tanto para a tradição cristã católica quanto para a tradição judaica. Para compreendermos melhor este momento histórico, é fundamental explorarmos como estas duas tradições se entrelaçam em um período crucial da história religiosa.

Na tradição católica, a Semana Santa representa um período de intensa devoção e reflexão espiritual. Durante este tempo sagrado, os fiéis revivem os momentos fundamentais da fé cristã: a Paixão, a Morte e, no ápice das celebrações, a Ressurreição de Jesus Cristo. O Domingo de Páscoa emerge como o ponto culminante destas celebrações, trazendo consigo uma mensagem poderosa de esperança e renovação, simbolizada pela vitória da vida sobre a morte.

O Significado da Páscoa Judaica

Para compreendermos o contexto histórico completo, é essencial reconhecermos que a Páscoa judaica, ou Pessach, representa um marco fundamental na história do povo hebreu. Esta celebração comemora um momento decisivo: a libertação do povo judeu após quatrocentos anos de escravidão no Egito. É particularmente significativo observar que os eventos finais da vida terrena de Jesus coincidiram precisamente com este período festivo judaico.

Jerusalém: Centro das Celebrações

Jerusalém, naquele período, ocupava uma posição central na vida religiosa judaica. O majestoso Templo de Salomão, localizado no coração da cidade, servia como epicentro das principais cerimônias religiosas. Durante o período pascal, que se estendia por oito dias, a cidade santa transformava-se em um verdadeiro centro de peregrinação, recebendo fiéis de todas as partes da Palestina.

Jesus em Betânia

Em meio a este cenário de intensa movimentação religiosa em Jerusalém, encontramos Jesus em um momento particularmente tocante de sua jornada. Embora as celebrações pascais estivessem em curso na cidade santa, ele havia se dirigido a Betânia, atendendo ao chamado urgente de duas amigas próximas, Marta e Maria, cujo irmão Lázaro encontrava-se gravemente enfermo.

Como registrado no Evangelho de João, capítulos 11, versículos 1-3 e 39, quando Jesus finalmente chegou a Betânia, deparou-se com uma situação ainda mais grave do que a inicialmente reportada: Lázaro já havia falecido e seu corpo jazia no sepulcro há quatro dias, em estado de decomposição.

O Milagre de Lázaro

Em um dos episódios mais extraordinários registrados nas escrituras, Jesus realiza o que viria a ser considerado seu milagre mais notável. Diante de numerosas testemunhas, com uma autoridade que emanava de sua própria natureza divina, Jesus ordenou com voz potente:

"Lázaro, sai para fora!"(João 11:43)

O impacto deste acontecimento foi imenso, provocando profunda comoção entre os presentes. A ressurreição de Lázaro representou um marco sem precedentes na história, e a notícia deste fenômeno extraordinário disseminou-se rapidamente por toda a Palestina, atraindo multidões que se dirigiam a Betânia para testemunhar pessoalmente o milagre.

A Entrada Triunfal em Jerusalém

O retorno de Jesus a Jerusalém durante as festividades pascais transformou-se em um momento de singular grandiosidade. A cidade, já repleta de peregrinos para as celebrações da Páscoa, foi tomada por uma atmosfera de júbilo extraordinário quando se espalhou a notícia de sua aproximação (João 12:12). O povo, movido por intensa emoção e reconhecimento, criou um cenário de celebração única: ramos de palmeiras foram dispostos ao chão, formando um tapete verde natural, enquanto hinos e salmos ecoavam pelas ruas da cidade santa.

O Simbolismo da Entrada Real

A forma como Jesus escolheu entrar em Jerusalém carregava um profundo significado simbólico. Diferentemente dos reis da época, que costumavam fazer suas entradas triunfais montados em cavalos imponentes após vitórias militares, Jesus optou por um jumento como sua montaria. Esta escolha não foi casual - representava a natureza singular de sua realeza. Como Príncipe da Paz, sua entrada humilde simbolizava que seu reino transcendia as conquistas terrenas, fundamentando-se nos princípios eternos do amor e da paz.

A Conspiração e os Preparativos para a Última Ceia

Em meio à exaltação popular, uma trama sombria se desenvolvia nos bastidores. Os fariseus, que já haviam decidido pela morte de Jesus (João 11:53-57), aguardavam um momento oportuno para efetuar sua captura, longe dos olhos do povo que o adorava. Jesus, plenamente consciente de sua situação e sabendo que seu tempo estava próximo (João 11:1), nutria um desejo especial de compartilhar uma última ceia pascal com seus discípulos (Lucas 22:11).

O Homem do Cântaro

Em um episódio marcado por elementos misteriosos, Jesus enviou Pedro e João com instruções precisas: deveriam encontrar, às portas da cidade, um homem carregando um cântaro. Esta figura enigmática, cujo nome permanece desconhecido nos registros evangélicos, seria o providencial anfitrião da última ceia. Conforme narrado em Lucas 22:8-13, este homem, em um gesto de generosa hospitalidade, disponibilizou sua casa para que Jesus e seus discípulos realizassem a sagrada celebração pascal.

A Promessa do Consolador

Durante a última ceia, Jesus compartilhou com seus discípulos uma promessa significativa que geraria diferentes interpretações ao longo da história. Nas palavras registradas no Evangelho de João, capítulos 14:15-26, Jesus anunciou a vinda de outro Consolador, uma presença que permaneceria com seus seguidores eternamente. Este momento crucial das escrituras merece uma análise cuidadosa em seu contexto histórico e espiritual.

O Consolador

Na perspectiva da doutrina espírita, este anúncio feito por Jesus representa um marco fundamental. O espiritismo, codificado por Allan Kardec no século XIX, é interpretado como a materialização desta promessa feita na última ceia. Segundo esta compreensão, assim como Moisés recebeu os Dez Mandamentos diretamente dos céus, Kardec teria sido escolhido como instrumento para sistematizar e codificar os ensinamentos transmitidos por entidades espirituais através de diversos médiuns.

O Espiritismo como Chave Interpretativa

A doutrina espírita propõe uma nova perspectiva para a compreensão dos ensinamentos cristãos. De acordo com esta visão, muitas das passagens que parecem enigmáticas nos textos sagrados encontram explicação mais clara através dos princípios espíritas. Esta interpretação sugere que, na época de Jesus, a humanidade ainda não possuía o desenvolvimento intelectual e científico necessário para compreender plenamente todos os ensinamentos transmitidos.

A Codificação Espírita

O desenvolvimento da doutrina espírita materializou-se através de cinco obras fundamentais: "O Livro dos Espíritos", "A Gênese", "O Livro dos Médiuns", "O Céu e o Inferno" e "O Evangelho Segundo o Espiritismo". Segundo os adeptos desta doutrina, estas obras representam uma revelação progressiva, possível apenas quando a humanidade alcançou um nível adequado de desenvolvimento filosófico e científico para compreender os ensinamentos mais profundos do Cristo.

O Legado do Amor na Última Ceia

Durante a última ceia, Jesus transmitiu aos seus discípulos um dos ensinamentos mais profundos e transformadores: a supremacia do amor como virtude fundamental para a evolução espiritual. Este momento singular estabeleceu um novo paradigma na compreensão do amor divino, transcendendo a antiga máxima de "amar ao próximo como a si mesmo" para um patamar ainda mais elevado.

A Dimensão do Amor Cristão

Jesus estabeleceu um novo parâmetro quando declarou: "Amai-vos uns aos outros. Não apenas como amais a vós mesmos, mas amai-vos ainda mais, como eu vos amei" (João 13:34). Esta afirmação revolucionária define a verdadeira identidade de seus discípulos: seriam reconhecidos não por sinais externos ou rituais, mas pela extraordinária capacidade de amar incondicionalmente.

O apóstolo Paulo, em sua primeira carta aos Coríntios, elaborou uma das mais belas e profundas reflexões sobre o amor já registradas. Sua mensagem, que atravessou séculos inspirando gerações, revela que mesmo os dons mais extraordinários - seja o dom das línguas, da profecia ou uma fé capaz de mover montanhas - tornam-se vazios sem a presença do amor. Esta passagem bíblica transcendeu sua origem religiosa para se tornar uma reflexão universal sobre a natureza do amor verdadeiro.

A narrativa apresentada no livro "Paulo e Estevão", psicografado por Chico Xavier e atribuído ao espírito Emmanuel, oferece uma perspectiva profunda sobre a universalidade do amor divino. Na cena final, quando Jesus, acompanhado de Estevão, encontra o espírito de Paulo após seu desencarne, revela-se uma verdade fundamental: no reino de Deus, verdugos e mártires são chamados à união eterna, ilustrando a natureza incondicional do amor divino.

O Serviço como Expressão do Amor

Na mesma última ceia, quando os discípulos discutiam sobre quem seria o maior no Reino de Deus (Lucas 22:24-27), Jesus apresentou um princípio revolucionário: a verdadeira grandeza espiritual se manifesta através do serviço ao próximo. O ato de servir torna-se, assim, a expressão prática do amor, formando com ele um binômio inseparável na jornada evolutiva do espírito.

Os verbos "amar" e "servir" emergem, assim, como as duas faces de uma mesma moeda espiritual. Não existe amor verdadeiro sem serviço, nem serviço autêntico sem amor. Esta conjugação representa o caminho para a elevação espiritual, conduzindo o ser humano em sua jornada rumo à angelitude.

A Dinâmica Psicológica da Última Ceia

A última ceia revelou-se como um momento de profunda significância psicológica, especialmente através dos episódios envolvendo Pedro e Judas. Estes eventos transcendem o mero registro histórico, representando arquétipos universais que habitam a psique humana. O modo como Jesus conduziu este momento demonstra uma sofisticada abordagem terapêutica, buscando trazer à consciência aspectos sombrios que necessitavam de reconhecimento e transformação.

A interação entre Jesus e Judas durante a última ceia revela uma dimensão particularmente profunda da pedagogia divina. Jesus, percebendo as perturbações psíquicas de seu discípulo, atuou como um mestre compassivo, empenhando-se em proporcionar uma última oportunidade de despertar espiritual. O momento culminante desta intervenção ocorreu quando Jesus, através do gesto simbólico do pão (João 13:26), tornou manifesta a iminente traição.

A Questão do Livre-Arbítrio

A frase pronunciada por Jesus a Judas - "Faça logo o que você tem que fazer" (João 13:27) - tem sido objeto de diversas interpretações ao longo da história. Contudo, é fundamental compreender que esta não representava uma determinação do destino, mas sim um chamado à consciência. Ninguém vem ao mundo com a missão de praticar atos negativos; a verdadeira missão de cada ser humano consiste na superação de suas próprias limitações e na transformação de padrões comportamentais inadequados herdados de experiências anteriores.

A complexidade do comportamento de Judas revela-se em sua profunda conexão com as ilusões materiais. Sua visão estava limitada por expectativas terrenas, acreditando que a entrega de Jesus ao Sinédrio desencadearia uma revolução política que resultaria na libertação do povo judeu. Esta interpretação equivocada foi possivelmente reforçada pela recente aclamação popular de Jesus em Jerusalém (João 12:13), onde a multidão o reconheceu como rei dos judeus.

A trajetória de Judas junto a Jesus durante todo seu ministério representa uma oportunidade extraordinária de evolução espiritual. Tendo recebido diretamente da fonte mais pura os ensinamentos espirituais, Judas encontrava-se diante do momento decisivo de sua jornada evolutiva. Sua experiência serve como um poderoso lembrete de que cada ser humano tem a responsabilidade de transformar sua perspectiva em relação ao mundo e a si mesmo.

O Despertar da Consciência

A narrativa de Judas representa um paradigma que transcende seu contexto histórico específico, servindo como um espelho para nossa própria jornada espiritual. Quando examinamos sua trajetória, percebemos que, assim como ele teve acesso direto aos ensinamentos de Jesus, muitos de nós também recebemos continuamente conhecimentos e experiências espirituais enriquecedoras. Esta analogia nos leva a uma reflexão profunda: de que maneira estamos aproveitando esse alimento espiritual para nossa transformação pessoal?

A sabedoria antiga nos ensina que existem dois momentos cruciais em nossa existência: o dia em que nascemos e o dia em que descobrimos o porquê de nosso nascimento. Esta descoberta está intrinsecamente conectada ao processo de evolução espiritual, que só pode ser alcançado através de um profundo trabalho de autoconhecimento. Nesta jornada, Jesus permanece como o paradigma supremo, iluminando nosso caminho em direção ao aperfeiçoamento moral com seus ensinamentos atemporais.

A Urgência da Transformação

O momento presente nos convoca a uma transformação urgente e profunda. As ilusões materiais, por mais sedutoras que sejam, carregam em si a marca da transitoriedade. Quando investimos excessivamente em conquistas materiais, corremos o risco de nos desviar de nosso propósito essencial na Terra. O tempo, em sua inexorável marcha, nos lembra constantemente da importância de priorizar nosso crescimento espiritual.

Quando permanecemos inertes diante do chamado à evolução espiritual, praticamos uma forma sutil, porém significativa, de traição aos propósitos superiores de nossa existência. Esta inércia representa não apenas uma traição ao nosso projeto encarnatório, mas também aos ensinamentos fundamentais de Jesus, que constantemente nos convidam à renovação interior. A responsabilidade de agir e transformar-nos é individual e intransferível.

Chico Xavier relata que o maior tormento que o espírito sofre após a desencarnação é a consciência do tempo perdido, que ressoa como um alerta fundamental para todos nós. Esta perspectiva nos convida a uma reflexão séria sobre como estamos utilizando o precioso tempo de nossa existência terrena, lembrando-nos que cada momento presente é uma oportunidade única e irrecuperável para nossa evolução espiritual.

Conclusão: O Chamado à Transformação Interior

A jornada através dos eventos da última ceia e seus desdobramentos nos oferece muito mais que um simples registro histórico - representa um convite permanente à reflexão e à transformação. As lições extraídas destes acontecimentos transcendem o tempo e o espaço, permanecendo vivas e relevantes para cada geração que se dispõe a estudá-las e compreendê-las.

O exemplo de Jesus, sua sabedoria ao lidar com as fragilidades humanas e sua capacidade de transformar momentos de crise em oportunidades de crescimento, nos ensina que a verdadeira evolução espiritual requer coragem, determinação e, sobretudo, amor. Seja através da promessa do Consolador, da ênfase no amor e no serviço, ou das lições extraídas dos momentos de traição e negação, cada aspecto desta narrativa nos convida a um despertar mais profundo de nossa consciência espiritual.

Em última análise, somos todos chamados a realizar nossa própria transformação interior, aproveitando cada momento presente como uma oportunidade preciosa de crescimento. O tempo não espera, e a urgência desta transformação se faz cada vez mais presente em nossa jornada evolutiva. Que possamos, inspirados pelos ensinamentos eternos do Cristo, encontrar a coragem e a determinação necessárias para realizar essa transformação enquanto o tempo nos favorece.

segunda-feira, 12 de março de 2018

Os Dois Alicerces

A Parábola dos Dois Alicerces: Uma Análise Espírita

A Parábola dos Dois Alicerces: Uma Análise Espírita

Todo aquele que vem a mim, ouve as minhas palavras e as pratica, será comparado ao homem prudente, que edificou sua casa, cavou fundo, aprofundou e colocou os alicerces sobre a rocha. Caiu a chuva, vieram as torrentes, sopraram os ventos, precipitaram-se contra aquela casa, mas não desabou pois fora edificada sobre a rocha. Mas o que ouve as minhas palavras e não pratica será comparado ao homem tolo, que edificou sua casa sobre a areia. Caiu a chuva, vieram as torrentes, sopraram os ventos, chocaram-se contra aquela casa; desabou, e foi grande a sua queda.

Mateus 7:24-27 e Lucas 6:46-49

A Interpretação Espírita dos Dois Padrões Mentais

A parábola dos dois alicerces, iluminada pelas revelações espíritas, permite-nos compreender que Jesus abordava dois padrões mentais distintos, ou dois níveis de consciência.

O Homem Prudente: O Primeiro Nível de Consciência

No primeiro nível, simbolizado pelo homem prudente (lúcido e desperto), temos a figura daquele que se volta para dentro de si mesmo em busca de autoconhecimento. Esse homem absorve as lições de Jesus e as incorpora em seu comportamento, vivendo as experiências da vida em conformidade com os ensinamentos do Cristo. Ele demonstra consciência, tanto no aspecto psicológico quanto espiritual, de que sua verdadeira felicidade não se encontra na satisfação das demandas do ego. Ele reconhece que os ensinamentos do Mestre constituem um roteiro seguro para alcançar a saúde, a paz, a plenitude espiritual e a felicidade. Por isso, age de maneira coerente, colocando em prática aquilo que aprende.

O Homem Tolo: O Segundo Nível de Consciência

No segundo nível de consciência, simbolizado pelo homem insensato, temos a imagem de alguém que direciona seu foco para o exterior, concentrando-se exclusivamente no mundo ao seu redor. Esse indivíduo até absorve os ensinamentos de Jesus, mas não os aplica em sua vida prática. Essa incapacidade decorre do fato de que a criatura humana, ainda não desperta para as realidades superiores da existência, permanece voltada prioritariamente para os aspectos materiais e para a satisfação das necessidades imediatas e fisiológicas.

Embora ouça as palavras do Mestre, ele as percebe de forma superficial, como um símbolo distante ou uma ideia abstrata, sem relação concreta com sua própria experiência de vida. Assim, falta-lhe o movimento interior necessário para transformar os ensinamentos em vivências, permanecendo preso à ilusão de que a felicidade reside exclusivamente nas conquistas externas e passageiras.

A Dualidade dos Padrões de Consciência

De forma concisa, podemos compreender que o homem prudente concentra-se em seu mundo interior, vivendo no reino de Deus, que está dentro de si, enquanto o homem insensato está voltado para o mundo exterior, vivendo no reino do mundo, que está fora. O primeiro aborda as experiências da vida com clareza espiritual, enquanto o segundo permanece adormecido psicologicamente e espiritualmente. O prudente ouve as lições de Jesus e se empenha em colocá-las em prática, enquanto o insensato as aprecia, reconhece sua beleza, mas não as assimila por falta de disposição interna.

Segundo a parábola, o primeiro padrão de consciência é capaz de enfrentar provações e expiações, pois aceita sua natureza espiritual imperfeita e consegue dominar os impulsos do ego. Já o segundo padrão de consciência falha ao lidar com desafios mais intensos, resistindo à aceitação de sua própria imperfeição espiritual. Incapaz de controlar os impulsos do inconsciente, ele sofre com doenças, vícios, depressão e, em casos extremos, pode até buscar o suicídio. A parábola destaca que a queda desse segundo padrão de consciência é profunda e dramática, evidenciando as consequências de uma vida desconectada dos valores espirituais.

O Exemplo de Pedro e Judas

O Evangelho de Jesus retrata esses dois padrões mentais através das figuras de Judas e Pedro, ambos discípulos que caminharam ao lado do Cristo e absorveram Seus ensinamentos, mas que, diante das provações, acabaram traindo o Mestre.

Judas, motivado por ambições pessoais e pela ilusão das conquistas materiais, entregou Jesus por trinta moedas de prata. Esse ato revela um padrão de consciência fragilizado, incapaz de priorizar os valores espirituais acima das tentações mundanas. Sua traição simboliza a incapacidade de resistir aos apelos do ego, e, ao perceber a gravidade de sua ação, Judas é consumido pelo desespero e pela culpa. Sem encontrar forças para enfrentar o erro e buscar reparação, sua casa, edificada sobre a areia, desmorona, levando-o ao suicídio.

Pedro, por outro lado, exemplifica um padrão de consciência mais elevado, mas ainda em processo de amadurecimento. Apesar de sua profunda lealdade e amor por Jesus, em um momento de extrema pressão e medo, ele negou conhecer o Mestre por três vezes durante a prisão de Cristo. Esse ato reflete não uma traição deliberada, mas uma fraqueza temporária, evidenciando o conflito entre os valores espirituais já internalizados e os impulsos instintivos de autopreservação. Contudo, ao contrário de Judas, Pedro reconhece sua falha, arrepende-se e, posteriormente, busca realinhar-se com os ensinamentos de Jesus, mostrando que sua casa estava sendo edificada sobre a rocha, ainda que em construção.

No entanto, quando o galo canta pela terceira vez, Pedro percebe a gravidade de seu erro e inicia um movimento de arrependimento profundo, voltando-se para dentro de si. Esse esforço de transformação pessoal permite-lhe reconstruir sua vida à luz dos ensinamentos de Jesus, tornando-se um dos maiores pilares do cristianismo primitivo. Sua trajetória demonstra que sua casa estava, de fato, edificada sobre a rocha, embora precisasse ser fortalecida por meio das provações e do aprendizado.

Enquanto Pedro fazia o movimento para dentro, buscando alinhamento interior, Judas, ao contrário, permaneceu voltado para o mundo exterior, preso às ilusões e às pressões que o levaram à queda.

Ambos os casos ilustram a dualidade da natureza humana, evidenciando como a luta entre os padrões de consciência é universal e constante. A capacidade de viver de acordo com os ensinamentos espirituais pode ser comprometida pelas fraquezas e tentações do mundo material. Essa lição reforça que até mesmo aqueles que conviveram com Jesus enfrentaram batalhas internas, ressaltando a importância do esforço contínuo para alinhar-se aos valores do reino de Deus.

O Autoconhecimento como Caminho

Para identificarmos o nível de consciência em que nos encontramos na encarnação atual, Jesus nos oferece uma reflexão essencial ao dizer: Onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração.

Essa frase nos convida a perguntar: onde está o nosso tesouro? Quais são os aspectos da vida que mais atraem nossa atenção? Com o que estamos ocupando nossas mentes e quais preocupações dominam nossos dias? Que tipo de pensamentos temos escolhido alimentar e nutrir?

As respostas a essas questões revelam de que forma estamos utilizando nossa energia psíquica, definindo assim o nosso nível de consciência, não sob a ótica fisiológica, mas sob a perspectiva espiritual. Elas mostram se nossas prioridades e ações refletem um movimento em direção ao reino de Deus, que está dentro de nós, ou se ainda estamos presos às ilusões e demandas externas.

Caso essa autoanálise revele que seguimos o padrão mental do homem insensato, é fundamental reconhecer a necessidade de esforço para transformação. A parábola sugere que, com o auxílio de Jesus e seus ensinamentos, podemos reorientar nossos pensamentos e atitudes, trabalhando para alcançar o padrão mental mais elevado que já vislumbramos e desejamos atingir. Esse movimento é um ato de coragem e comprometimento com o autoconhecimento e a espiritualidade, fortalecendo a edificação da nossa casa sobre a rocha.

E,para isso, a doutrina espírita oferece valioso auxílio ao nos ensinar como trilhar esse caminho de transformação. A questão 919 de O Livro dos Espíritos nos aponta a direção:

Conhece-te a ti mesmo.

Essa máxima, conhecida desde os tempos da filosofia grega, é reforçada pela orientação espiritual como a chave para o progresso moral e espiritual.

Conclusão: A Construção do Ser Interior

Construir a casa sobre a rocha, vivenciando os ensinamentos de Jesus, é um processo que se realiza no mundo íntimo, exigindo um esforço árduo e contínuo de autoconhecimento. Essa edificação não é apenas um ato de vontade, mas um trabalho profundo e gradual no campo dos sentimentos e da consciência.

Por meio do autoconhecimento, o indivíduo aprende a identificar e reduzir as demandas do ego, criando espaço para que o Eu interior (Self) se manifeste plenamente. Esse movimento simboliza a transformação do homem velho, preso às ilusões e fragilidades do mundo, em um homem novo, alinhado com os valores espirituais e com a essência divina que habita em cada um de nós.

Esse processo não deve ser encarado como uma batalha, mas como um ato de iluminação das sombras internas, seguindo o convite de Francisco de Assis:Onde houver trevas, que eu leve a luz.Ao iluminar as áreas obscuras de nossa mente e coração, deixamos de resistir às provações e passamos a integrá-las como oportunidades de aprendizado e evolução.

O propósito do autoconhecimento, portanto, é justamente esse: trazer luz ao nosso mundo interior, permitindo que, iluminados pelos ensinamentos de Jesus e pela prática do evangelho, possamos caminhar com firmeza e segurança, evitando os tropeços que surgem da ignorância ou do desconhecimento de nossa própria natureza. É esse trabalho constante que fortalece nossa edificação espiritual sobre a rocha inabalável da fé e da consciência elevada.

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

O moço rico

O Encontro de Jesus com o Moço Rico - Uma Lição sobre Valores e Desapego

O Encontro de Jesus com o Moço Rico

O encontro de Jesus com o moço rico, registrado em Mateus, 19:16 a 24; Lucas, 18:18 a 25; e, Marcos, 10:17 a 25, surge como um autêntico convite à reflexão acerca dos valores que escolhemos para serem o epicentro de nossas existências.

O Contexto Histórico do Encontro

De início, é digno de realce o gesto do jovem rico ao se dirigir ao encontro de Jesus. Estando ele na juventude e gozando de riqueza, pertencia à elite judaica. Em contrapartida, Jesus representava um homem do povo, circulando entre as fileiras da multidão composta por desfavorecidos, enfermos e indivíduos de reputação questionável.

Naquela época, não era frequente que um homem abastado se entrelaçasse com as massas. Ainda mais incomum era alguém de posição social proeminente, como o jovem rico, procurar o aconselhamento de um homem simples do povo.

Jesus enfrentou intensas críticas e oposições por interagir com aqueles marginalizados pela sociedade daquela época. Como resultado, indivíduos de classes sociais mais elevadas, intelectuais e eruditos evitariam buscar Jesus em público. Caso sentissem a necessidade íntima de se conectar com ele, seguindo o exemplo de Nicodemos, o doutor da lei, procurariam-no sob o manto da noite, buscando o encontro discreto a fim de minimizar a exposição.

O jovem rico, entretanto, transcende a barreira do preconceito e procura Jesus à luz do dia, revelando, por meio desse ato, a magnitude de conflitos e inquietações que carregava consigo.

O Diálogo Transformador

Ao se aproximar de Jesus, o moço lança imediatamente uma pergunta.

- Bom Mestre, que devo fazer para conseguir a vida eterna?

A pergunta visava a obter uma resposta que desvendasse o caminho para alcançar a paz interior. Afinal, é desafiador compreender por que um jovem rico estaria em busca do significado da vida eterna, a menos que estivesse à procura dessa serenidade profunda.

Jesus fixa o olhar no íntimo do jovem e, antes de responder, lhe esclarece: "Por que me chamas de bom? Não há bom senão um só, que é Deus."

Os Ensinamentos e a Resposta do Jovem

O Mestre recusa o título de bom e o redireciona para Deus, ilustrando que diante dos desafios do mundo, a busca primordial deve ser direcionada a Deus.

Logo após, Jesus responde ao jovem: "Se desejas alcançar a eternidade, observa os mandamentos: não furtarás, não darás falso testemunho, honra teu pai e tua mãe, não cometerás adultério, entre outros."

Entretanto, o jovem reage com surpresa, assegurando ter sempre obedecido aos mandamentos. E ele acrescenta, indagando: "O que mais me falta?"

O Desafio do Desapego

A pergunta evidencia que o jovem, apesar de cumprir os mandamentos conforme a tradição, não experimentava uma realização espiritual completa. Isso reflete uma realidade comum a muitos seres humanos, que mesmo dedicando-se ao estudo do evangelho e ao auxílio ao próximo, não conseguem alcançar a plenitude.

"Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me".

Ao escutar essas palavras, o jovem partiu com tristeza, pois detinha muitas posses. O chamado de Jesus representava uma demanda que ele não estava disposto a aceitar, pois sua afeição por suas posses era forte demais para abdicar delas.

A Mensagem Final

Disse, então, Jesus aos seus discípulos: "em verdade vos digo que é difícil entrar um rico no reino dos céus. E, outra vez vos digo que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus".

Essas palavras frequentemente foram mal interpretadas, levando à crença de que Jesus estava condenando a riqueza e os bens materiais.

Contudo, é evidente pelo próprio contexto que Jesus não estava condenando a riqueza, uma vez que os próprios discípulos compreenderam isso e, consequentemente, questionaram: "Nesse caso, quem pode ser salvo?"

Se Jesus estivesse realmente condenando a riqueza, a pergunta dos discípulos — "Quem então poderá salvar-se?" — não faria sentido, especialmente considerando que eles eram pessoas de poucos recursos. O cerne da mensagem concentra-se no desapego dos bens terrenos, uma qualidade que tanto ricos quanto pobres podem cultivar.

Reflexões sobre o Materialismo Contemporâneo

A centralização dos interesses na posse de bens materiais levou a uma sociedade profundamente materialista e consumista, com um forte apego aos bens terrenos.

Esse apego aos bens materiais se manifesta de maneira óbvia em diversos momentos, inclusive nos momentos mais simples e cotidianos. Seja na satisfação e alegria ao adquirir novos objetos, na necessidade de exibi-los, ou mesmo na tristeza que surge ao perder um bem.

O materialismo também se evidencia nas ações humanas quando se empenha em múltiplas atividades com fins lucrativos, muitas vezes em detrimento do descanso e do convívio familiar, visando acumular recursos para concretizar um determinado desejo de consumo. Da mesma forma, se manifesta quando sentimentos negativos emergem diante da impossibilidade de adquirir o que se anseia.

Conclusão

O encontro entre Jesus e o jovem rico é um episódio repleto de convites de natureza espiritual.

O Mestre nos convida a sempre buscar Deus como solução para nossos conflitos; nos convida a empreender uma reforma íntima, eliminando as imperfeições morais que bloqueiam o desenvolvimento de virtudes genuínas; nos chama a praticar o desapego em relação aos bens materiais, e a nutrir valores espirituais, aprimorando nossas interações com os outros.

Isso porque o maior investimento que podemos realizar nesta encarnação reside no domínio dos sentimentos.